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Recuperar lá fora os sonhos que aqui “faliram”
2010-03-17
Há quem defenda que a nova vaga de emigração portuguesa vai atingir os valores dos anos 60 e 70. Na Beira Interior, todos os dias há pessoas a sair. Nas páginas que se seguem, mostramos alguns casos

PARA uns é apenas o início. Para outros é uma espécie de recomeço. Jovens que vão à procura dos primeiros euros. Pessoas que assistiram à "falência" dos seus sonhos e que agora tentam, além fronteiras, assegurar a sobrevivência das famílias. Duas visões diferentes da nova vaga de emigrantes portugueses, com a Beira Interior a apresentar mais uma vez altas percentagens desse êxodo para o estrangeiro. Alguns especialistas acreditam mesmo que estamos perante um cenário semelhante ao dos anos 60, quando milhares e milhares de portugueses foram obrigados a "dar o salto".

Essa expressão - "dar o salto" - reflectia as dificuldades sentidas para sair do país. Era preciso contornar a fronteira ou "comprar" os guardas. Sobre essa realidade, o JF publicou na edição passada um conjunto de entrevistas com vários passadores, portugueses e espanhóis, que ajudavam as pessoas a "saltar" de Portugal para Espanha.

Agora debruçamo-nos sobre a emigração actual. As facilidades são totais para quem quiser sair deste rectângulo, sobretudo para a União Europeia de que somos cidadãos de parte inteira. Com o próprio carro, em carrinhas de transportes internacionais, de comboio ou avião, as alternativas são mais do que muitas. Se a isto juntarmos as dificuldades económicas cada vez maiores, é fácil perceber que o status quo nacional convida à saída. Ficar aqui a fazer o quê? O melhor é arriscar já, pensarão muitos daqueles que diariamente deixam o país que os viu nascer. É uma espécie de emigração silenciosa, de que poucos se apercebem. E qual o destino a tomar? Quatro países dominam os números da nova emigração portuguesa: Espanha, Angola, Inglaterra e França.

A Espanha por diversos factores. À cabeça está, obviamente, a proximidade. Há muito que o país vizinho tem dado trabalho e orçamento a famílias portugueses, com muita gente (sobretudo homens) a trabalharem do lado de lá da fronteira durante a semana e a regressarem a casa no fim-de-semana. No entanto, as coisas têm vindo a mudar e estima-se que, a cada ano, aumenta em 15 mil o número de emigrantes lusos em Espanha. Gente que já não vem ao sábado e domingo. Gente que constrói (ou reconstrói) por lá a sua vida. Neste momento haverá mais de 120 mil portugueses a residir no país vizinho, em situação perfeitamente estável e com elevados índices de integração. A esses há que juntar ainda "30 mil que viverão em situações mais precárias", segundo o economista Manuel Ramires de Oliveira, conselheiro da Embaixada de Portugal em Madrid.

A nova situação política e económica tem feito de Angola um país novamente apetecível. O clima poderá ser um obstáculo, mas a semelhança da língua é uma importante ajuda e atrai gente de todas as idades. Alguns milhares de portugueses têm partido para lá, integrados em projectos das grandes empresas lusas, mas aos poucos são conhecidos casos de pessoas que estão a avançar praticamente sozinhas em busca de novas oportunidades. E os especialistas dizem que nos próximos anos a saída para Angola vai aumentar exponencialmente.

Relativamente a Inglaterra, o regular crescimento da economia e o valor superior da Libra em relação ao Euro são factores que atraem desempregados em Portugal. E muitos deles com qualificações académicas. Gente para quem o idioma britânico não é um problema. Nesta década, o Reino Unido tem recebido cerca de 20 mil portugueses por ano e estima-se que actualmente vivam em terras de Sua Majestade aproximadamente 400 mil.

A França foi, é e será sempre um destino de muitos emigrantes. É lá que está a maior comunidade portuguesa. É lá que estão muitos familiares. É lá que mais facilmente uma porta se abre, dando abrigo nos primeiros tempos. A França é o parceiro eterno. Parece que arranja sempre espaço e trabalho para mais um português. Há famílias inteiras a rumar às maiores cidades gaulesas. Há muitos filhos de antigos emigrantes que até nasceram em França nos anos 70 e que agora se vêm obrigados a repetir a epopeia dos pais. Já sabemos que há ciclos da história que se repetem. Ninguém esperava é que fosse tão cedo.

Depois, há ainda gente a instalar-se em países como a Suíça, o Luxemburgo ou os EUA, destinos já tradicionais para os portugueses. Portugal perde pessoas. Sim, perde. Porque alguma da emigração ainda é sazonal, mas a maior parte é definitiva. É gente que não volta mais.

Novos "bidonvilles"

Quem acompanhou o fenómeno da emigração portuguesa para França nos 60 e 70, certamente teve conhecimento das más condições em que viviam milhares e milhares de pessoas, nos denominados "bidonvilles", autênticos bairros de lata, sem o mínimo de dignidade. Felizmente, muita coisa mudou até à viragem do século e os próprios países de acolhimento preocuparam-se em evitar essas situações.

No entanto, nos últimos anos novas preocupações têm surgido, sobretudo e Espanha, onde muitos portugueses trabalham e vivem em condições muito precárias. É uma situação que as autoridades portuguesas e espanholas precisam de monitorizar e resolver.

Recentemente, também no Luxemburgo foram detectados portugueses a viver em quartos improvisados em sótãos e caves de cafés. O jornal luxemburguês "Contacto" relatou mesmo o caso de um casal (com bebé de três meses) que vivia num quarto com nove metros quadrados.

CASO 1

Foi num dia frio, enquanto estavam sentados à lareira e desfrutavam um dos raros momentos em que ainda conseguiam estar juntos, que Prazeres Rocha e Joaquim Martinho, ambos com 33 anos, tomaram a decisão de mudar as suas vidas e a dos respectivos filhos, na altura com um e três anos. O jovem casal, que vivia na Guarda, estava exausto da luta diária que implicava gerir os respectivos horários laborais e a vida familiar. "Trabalhávamos de sol a sol e mal tínhamos tempo para nós e para os meninos, além disso, tanto esforço não trazia a compensação financeira almejada. Chegámos a uma altura das nossas vidas em que era imperioso ganharmos alguma qualidade de vida", revela Prazeres Rocha. Analisadas as hipóteses, o casal depressa percebeu que na região e mesmo no país as oportunidades eram reduzidas. Emigrar foi a única solução encontrada. Espanha o destino. (mais informação da edição semanal).

CASO 2

Sérgio Domingues emigrou para o Luxemburgo há quase dois anos. Na altura finalizava um curso de Turismo na Escola Profissional na Raia. A viver em Castelo Branco, tentava conciliar os estudos com o trabalho. "Chegamos a uma certa idade e queremos é ganhar o nosso dinheirinho". Trabalhou algum tempo na Delphi, depois em duas pizarias.

Através de amigos, viu-se tentado a alargar os horizontes, fora do país. "Não vislumbrava em Portugal oportunidades de emprego, principalmente na área do turismo, que é uma área que me interessa bastante", explica. Assim, um amigo, já emigrado e cujo pai tem negócio na área da hotelaria e restauração, convidou-o a fazer as malas para seis meses de trabalho no Luxemburgo. (toda a história na edição semanal)

CASO 3

A história de Xano não é propriamente um "London Calling", citando o mítico álbum e tema dos The Clash. Há aqui uma pequena variante: Xano respondeu a um chamamento, sim, mas ao chamamento de Brighton, um Brighton calling. Alpedrinha ficou lá para trás. O impassível caminhar do tempo fê-lo cruzar outros destinos. "Os motivos pelos quais decidi emigrar foram principalmente pessoais. Em 2001 os recibos verdes proliferavam. Posso dizer claramente que nunca tive uma experiência de emprego seguro na Beira ou mesmo em Portugal", reflecte. Xano Matos, de 35 anos, considera que "a minha geração foi a cobaia da abertura dos mercados europeus. (toda a entrevista na edição semanal)

CASO 4

Nasceram em Madrid (filhos de uma portuguesa e de um iraniano), mas ainda muito novos vieram com a mãe para Valhelhas. Foi nessa aldeia do concelho da Guarda que cresceram. Nilufar e Shahriar Kahnamooian Fonseca partilharam toda uma vida, as brincadeiras na rua, os tempos da escola, as borbulhas da puberdade, os mergulhos no rio Zêzere, os primeiros namoros. Etapas de dois irmãos que seguiram rumos diferentes no início da juventude. Shahriar, hoje com 25 anos, foi para os EUA. A irmã, de 26, seguiu para França. (reportagem completa na edição semanal)

CASO 5

Fundão tão facilmente rima com paixão como com desilusão. Terá sido algures neste misto de proclamações contraditórias que Hélder Barroca se aventurou durante dois anos como empregado de mesa numa empresa norte-americana de cruzeiros de luxo, onde correu mundo. Regressou ao Fundão por uns tempos, mas a vontade voltou a ditar a saída das malas do armário e rumar para a Catalunha: "a minha escolha por Barcelona assenta no facto de já ter amigos a viver cá, o que me permitiu uma adaptação mais rápida à cidade e às suas gentes. E também o facto de Barcelona ser um dos maiores destinos turísticos da Europa." (leia todo o artigo na edição semanal)

Filipe Sanches, Catarina Canotilho e Nuno Francisco

Jornal do Fundão, aqui.

 

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