Entrevista realizada por telefone, 20 de Janeiro de 2010, por Filipa Pinho.
Observatório da Emigração (à frente OEm) - O que é que o levou a estudar a emigração portuguesa, e mais concretamente os imigrantes portugueses no Reino Unido?
José Carlos Almeida (à frente JCA) - Eu estudei sociologia na Universidade da Beira Interior e fiz o doutoramento na Universidade de Bristol, aqui em Inglaterra. E nessa altura eu até me interessava mais por imigração e por etnicidade em Portugal, mais do que propriamente por emigração. Mas, até por questões de história familiar, posso dizer que sempre me interessei pelo fenómeno da emigração portuguesa. E depois de regressar a Portugal, apercebi-me que a emigração portuguesa aqui para o Reino Unido estava a crescer enormemente, isto no início dos anos 2000, e apercebi-me da falta de investigação sobre esta população. Então, regressei ao Reino Unido em 2006 com uma bolsa de pós-doutoramento da FCT e nos os primeiros tempos estive no Migration Research Unit, no departamento de geografia da University College London, onde trabalhei directamente com o Professor John Salt e foi importante estar em contacto com uma equipa com uma abordagem transdiciplinar no que toca ao estudo das migrações internacionais. O meu trabalho aí foi, essencialmente, de recolha e análise de todos os dados disponíveis que pude encontrar, para conseguirmos ter uma primeira imagem global da comunidade aqui no Reino Unido e para ter uma noção mais exacta sobre os fluxos migratórios. Depois, tive contacto com um pequeno grupo de investigadores que trabalham sobre a imigração portuguesa - ou deveria dizer lusófona - aqui no Reino Unido, incluindo o Professor David Corkill.
OEm - Quando refere lusófona, quer dizer brasileiros, africanos...?
JCA – Sim, a população que aparece muitas vezes referenciada como portuguesa, refere-se muitas vezes a diferentes grupos lusófonos. E este grupo debruça-se não só sobre os portugueses, mas também alguns outros grupos de outros países, como brasileiros, angolanos, por aí fora. E este, digamos que é um grupo muito pequeno, mas relativamente activo: temos encontros para apresentar e discutir ideias; vai ser publicado um número especial da Portuguese Studies com resultados da investigação deste grupo... Portanto, o caso dos portugueses e da emigração lusófona também tem ganho alguma visibilidade, que não tinha até há pouco tempo, em termos de agenda de investigação.
OEm - Um bocadinho atrás disse "até por razões familiares quis estudar a emigração"...
JCA – Sim, tenho família em vários países do mundo, não é nada de novo numa família portuguesa. E também não é incomum encontrar investigadores com este background. Talvez que, como alguém me dizia aqui há tempos, exista um elemento auto-biográfico por detrás disso.
OEm - Portanto, neste momento trabalha com esse grupo de investigação...
JCA – Neste momento eu trabalho com o Professor David Corkill no MERI - Manchester European Research Institute - e debruçamos a nossa atenção em dois aspectos principais sobre a imigração portuguesa no Reino Unido. Um primeiro aspecto, a dispersão geográfica da nova vaga de imigrantes que chegam ao país a partir dos finais dos anos 1990 e a sua integração em pequenas cidades das zonas mais rurais. Um outro aspecto que tem também realce na nossa investigação e que estávamos a falar, que é a diversidade da comunidade no que toca à origem, ou seja, ao país de nascimento. E, por exemplo, os nossos dados indicam que cerca de 35% dos registados no consulado de Londres, e mais de 50% no consulado de Manchester, são cidadãos nascidos fora de Portugal, ou seja, em países como Angola, Índia, Moçambique, Brasil, África do Sul, Macau ou Venezuela.
OEm - Portanto, nacionalidade portuguesa com naturalidade... diversa?
JCA – Sim, sim. Nascidos antes de 1974 em vários locais do império; ou que entretanto ganharam acesso legal à nacionalidade portuguesa e assim podem aceder à Europa e ao Reino Unido para viver e trabalhar ou estudar (por exemplo um estudante universitário angolano ou chinês tem de pagar overseas fees enquanto que um português paga home fees).
OEm - Nascidos em Portugal serão à volta de quantos?
JCA – Dos registados no Consulado de Londres (142.000) os nascidos em Portugal serão cerca de 65%, mais ou menos.
OEm - E outras estatísticas de que disponha?
JCA – É muito difícil conseguir estatísticas, porque apesar de existirem imensas fontes os resultados são completamente diferentes. Por exemplo, ao nível de stocks, existem estimativas e dados tão diferentes que vão dos 70 mil aos 700 mil. As autoridades portuguesas aqui, os consulados, dizem que haverá cerca de 350 mil residentes, portanto é muito difícil conseguir dados exactos para avaliar stocks, como também fluxos migratórios.
OEm - Falou da dispersão geográfica pelo Reino Unido. Em que zonas se fixam mais os imigrantes portugueses?
JCA – A grande zona de concentração continua a ser Londres e o Sudeste. Mas com o aumento dos fluxos dos anos 2000 veio o fenómeno novo da dispersão geográfica. E hoje podemos encontrar concentrações fora de Londres, em locais como, por exemplo, Chard, no Sudoeste, ou em Thetford, em East Anglia. Isto são cidades pequenas, em que os portugueses se concentram em trabalhos de agricultura e em indústrias relacionadas, de processamento de vegetais ou carne, e são, actualmente, uma parte significativa da população desses locais. Por exemplo, em Thetford, que terá cerca de 28 mil habitantes, os portugueses serão, ou já foram, cerca de um terço. E, portanto, isso coloca alguns desafios às comunidades locais; e também aos próprios portugueses.
OEm - Falou em agricultura?
JCA – Sim. Isto em zonas rurais, porque em zonas urbanas eles concentram-se em restauração, hotelaria, construção, etc.
OEm - Isso, nas zonas urbanas?
JCA – Em zonas mais urbanas, como por exemplo em Londres.
OEm - Que outras características salientaria, do seu conhecimento, na emigração portuguesa para o Reino Unido?
JCA – Ora bem, em termos de características, estamos a falar essencialmente de migração laboral, apesar de haver um número crescente de profissionais qualificados que vêm trabalhar por exemplo em bancos, empresas de aeronáutica e empresas petrolíferas. Ou que vieram para estudar, nomeadamente para fazer doutoramentos ou pós-doutoramentos, e muitos deles depois acabam por desenvolver as suas carreiras aqui em instituições britânicas. Mas eu diria que a grande maioria são imigrantes laborais. E, portanto, são essencialmente jovens, com menos de 30 anos, que ou não encontram trabalho, ou ficaram desempregados e encontram na emigração uma válvula de escape. Portanto, acaba por ser uma mão-de-obra barata que alimenta as necessidades de indústrias de construção, ou de restauração e hotelaria em zonas urbanas, ou da agricultura e indústrias relacionadas nas zonas mais rurais. E há, inclusivamente, grandes empresas deste sector que continuam a recrutar em Portugal e que têm gabinetes de recrutamento permanentes aí, como por exemplo a Bernard & Mathews, uma empresa de processamento de carnes com fábricas em East Anglia.
OEm - Que justificação existe para eles recrutarem em Portugal?
JCA – Eles começaram a recrutar em Portugal porque nos princípios dos anos 2000, final dos anos 1990, havia necessidade de mão-de-obra para estas indústrias naquela zona da East Anglia. E Portugal começou a ser uma fonte dessa mão-de-obra barata. E neste momento, por exemplo, só uma das fábricas tem cerca de mil trabalhadores portugueses. Existe a necessidade constante de mão-de-obra. O que é curioso é que a partir de uma certa altura, em 2004, a mão-de-obra portuguesa nessa zona começou a competir com mão-de-obra vinda dos países de Leste. Mas, de qualquer das formas, eles continuam a recrutar activamente em Portugal.
OEm - Tem conhecimento de recrutamentos deste tipo se realizarem entre os próprios imigrantes, ou de activação de redes para ajuda entre imigrantes?
JCA – Sim, existe alguma indicação de que há redes de ajuda entre a própria comunidade. O que é curioso é que não é só para a vinda de Portugal e para a mobilidade dentro do próprio país, mas também para a mobilidade a nível transnacional de outros países com forte presença portuguesa. Há algumas indicações de que essas redes estão activas a nível transnacional. Se me perguntar se houve algum período de retorno significativo, eu creio que não, mas com esta crise económica algumas pessoas procuram outro país. E também nesse segundo e terceiro movimento, isso é feito recorrendo a essas redes de ajuda através de amigos, família, etc.
OEm - E há algum país que se destaque como destino desses segundos ou terceiros movimentos?
JCA – Antes desta crise forte ter começado também em Espanha, era o país para onde as pessoas estavam a ir. Neste momento não é muito claro para onde está a ir esse segundo movimento. E eu entrevistei pessoas que vinham da Venezuela, vinham da Holanda, não vinham directamente de Portugal.
OEm - E nascidos nesses países?
JCA – Não, tinham nascido em Portugal. Tinham feito uma primeira experiência num desses países e vêm para Inglaterra depois. E se em Inglaterra não conseguem os seus objectivos, vão para outros países. Portanto, muita gente está preparada para mudar de residência frequentemente e parece existir um grau de mobilidade significativo entre os vários países da diáspora portuguesa.
OEm - Quando diz que esta emigração recente para o Reino Unido começou no início dos anos 2000, terá sido quando começou o recrutamento por essa empresa, ou não teve nada a ver? Encontrou alguma explicação para ter começado nessa altura?
JCA – Foi em 2001, 2002, que começou um ciclo menos favorável na economia portuguesa. Portanto, creio que no fundo foi a combinação destes dois factores: mão-de-obra disponível em Portugal e procura de mão-de-obra nestas zonas aqui no Reino Unido.
OEm - Já falou nas regiões, nas idades, na migração laboral... Confirma mais homens, ou já vão também mulheres na mesma proporção?
JCA – As diferentes fontes estatísticas mostram que são mais homens do que mulheres, mas existe alguma aproximação. Agora, o que nós temos também verificado é que existe um certo número de pessoas com mais idade que, por exemplo, ficaram desempregadas e que, com 45 ou 50 anos, não conseguem encontrar um novo trabalho em Portugal, porque dizem que já são demasiado velhas para trabalhar; e alguns que, mesmo estando já reformados, vêm sobretudo para ajudar os seus filhos, nomeadamente a cuidar dos netos enquanto os filhos vão trabalhar. Portanto, apesar de alguma diversidade da comunidade, eu diria que é, de facto, uma população relativamente jovem, pouco qualificada e que por isso se concentra neste tipo de trabalhos, sobretudo manuais, indiferenciados.
OEm - E como é que essas pessoas fazem com a questão da língua? Existem dificuldades a esse respeito?
JCA – Também existe alguma diversidade a esse nível, mas existe muita gente que, de facto, não tem sequer o domínio da língua. Por exemplo, quando se compara com os imigrantes polacos, com quem os portugueses competem neste momento directamente, perdem. Em geral, os polacos têm um maior domínio da língua. E o facto de os portugueses não terem o domínio da língua coloca entraves naturais à sua integração, nomeadamente no mercado laboral.
OEm - Como é que ultrapassam esse tipo de dificuldades? Há cursos? Existe algum tipo de apoio?
JCA – Existem alguns cursos, mas muitos dos portugueses também não têm o domínio da língua e não melhoram, muitas vezes porque não necessitam. Por exemplo, em Thetford muitos portugueses não necessitam de falar inglês para viverem a sua vida quotidiana, porque estão inseridos numa comunidade mais ou menos fechada, em que trabalham e vivem num ambiente de língua portuguesa e, por isso, não desenvolvem o inglês. Vivem com portugueses, trabalham com portugueses, fazem compras em sítios portugueses e portanto o inglês não é desenvolvido. Para ultrapassar isso, em Thetford, por exemplo, existiam alguns cursos promovidos através de associações locais, úteis sobretudo para pessoas que queriam encontrar trabalhos. As últimas indicações que tive foi que têm problemas ao nível dos financiamentos, agora complicados de conseguir devido à crise económica.
OEm - Falou dos pais dos imigrantes que vão ajudar com as crianças enquanto eles vão trabalhar...
JCA – Não são muitos os casos, mas tenho-me apercebido de alguns, sim.
OEm - Tem conhecimento de casos de pessoas que vão sem trabalho e que, enquanto não encontram, ou por não encontrarem, recorrem à segurança social britânica?
JCA – Esse é um aspecto muito interessante, porque em conversas com membros da comunidade apercebi-me de que existe algum ressentimento sobre alguns imigrantes que tinham chegado há uns anos atrás e vinham aproveitar-se dos benefícios do sistema de segurança social. Ou seja, pessoas que vinham porque tinham conhecimento que aqui o sistema de segurança social era bastante generoso e, portanto, vinham com esse fim. E os dados que tenho, referentes a 2001/2002 indicam que a proporção de nacionais portugueses que chegaram nesse ano e que estavam a usufruir de benefícios 6 meses depois de obter o National Insurance Number era de 12%, atrás dos nacionais da Turquia e Holanda.
OEm - Mas, então, não se pode chegar e pedir logo esse tipo de benefícios, ou pode?
JCA – O que as regras dizem é que tem que se ter trabalhado e contribuido algum tempo para aceder aos benefícios. Mas aparentemente era relativamente fácil "entrar" no sistema para, por exemplo, conseguir uma casa dos councils locais. Eu creio que neste momento já não é tanto o caso até porque as regras vão mudando e a fiscalização/controlo também vai aumentando. Mas existe uma crescente discussão pública precisamente sobre o acesso dos imigrantes (quer da UE, quer do resto do mundo) a esses benefícios.
OEm - Tem conhecimento de casos de mobilidade social descendente, ou seja, de pessoas que aí em Inglaterra fazem trabalho pouco qualificado, mas que cá em Portugal tivessem uma situação profissional mais favorável?
JCA – Sim. Mais uma vez, não são muitos os casos, mas tenho-me apercebido que, por exemplo, na East Anglia, alguns dos recrutados para essas fábricas de processamento de carnes são pessoas licenciadas. Isso é também um fenómeno novo. Se bem que eu não tenha conhecimento de números.
OEm - Queria pedir-lhe que nos fizesse uma síntese e nos indicasse se há mais diferenças entre imigrantes por regiões de fixação, além das profissionais. Ou seja, há características específicas dos imigrantes consoante as regiões em que se fixam?
JCA – Para além do que já referi existem também aquilo que eu chamo de concentrações por origem, ou seja, por país de nascimento. Por exemplo, existe uma concentração de algumas centenas de nacionais portugueses nascidos em Timor-Leste, por exemplo em Crewe e na Irlanda do Norte. Os nascidos em Macau concentram-se nas áreas metropolitanas como Manchester ou Londres. Os nascidos em Moçambique e Índia, em Leicester. Os nascidos na Guiné-Bissau, no país de Gales. Portanto, isto naturalmente questiona noções existentes, como por exemplo pertença, cidadania, nacionalidade e tem certamente impactes na forma como os indivíduos e os grupos se organizam e como vivem, como reconstroem a sua identidade. E, por exemplo, uma entrevistada dizia-me, aqui há tempos, "quando me toca a assinar o contrato, sou portuguesa, mas toda a gente me conhece como brasileira".
OEm - Porque ela tinha nascido no Brasil...
JCA – Sim. Ela e toda a sua família eram brasileiras, o avô era português e emigrou para o Brasil e através do seu avô tinham conseguido com que toda a família tivesse a nacionalidade portuguesa e tinham conseguido o acesso à Europa. Aliás, segundo as autoridades portuguesas, mais ou menos 70% das pessoas que se dirigem diariamente aos consulados são gente não nascida em Portugal, como nacionais de origem indiana, brasileira, angolana, etc.
OEm - Pois, origens muito diferentes... Que tipo de integração diria que os portugueses têm no Reino Unido? Estão bem integrados?
JCA – Como disse, realmente depende um pouco das zonas e do tipo de comunidades existentes. Em Londres ou nas Ilhas de Guernsey e Jersey, há portugueses a viverem há mais de 40 anos (uma grande parte de origem madeirense) e, portanto, aí a integração é feita já de outra maneira. Em zonas como, por exemplo, Thetford ou Chard, em que os imigrantes se têm estabelecido mais recentemente, e onde a comunidades portuguesa e a inglesa vivem lado a lado, não me apercebi de grandes contactos. Isto, claro, tem a ver com aquele aspecto que eu há pouco dizia, em que a comunidade portuguesa é um pouco fechada e a inglesa também não se relaciona. E, portanto, os portugueses continuam sem aprender a língua inglesa e continuam sem conseguir falar com os ingleses. Portanto, vivem lado a lado, mas sem grandes contactos e interacção de parte a parte.
OEm - Que contactos mantêm os imigrantes com Portugal? O que é que lhe disseram?
JCA – Contactos existem, sim, e muitos. Hoje é muito fácil viajar e muitos vão regularmente a Portugal, inclusivamente para coisas tão mundanas como ir ao dentista. Isto é verdade sobretudo quando se vive muito perto de um aeroporto internacional. No que toca a ligações mais emocionais, de reconstrução de identidade, verificámos que a festa do 10 de Junho é a principal festa da comunidade. E em zonas de grande concentração, como Londres ou Thetford, organizam-se eventos importantes, e isto porque nesta zona existem os clubes e associações que têm papel relevante por exemplo nestas festas. Noutras zonas, em que a infra-estrutura comunitária ainda não existe, ou é incipiente, uma vez que a fixação é muito recente, isto não se nota tanto. Noutros aspectos, há como que um alheamento quase completo. Por exemplo, ao nível das eleições, apenas algumas centenas votam aqui nos consulados. Mas este desinteresse pelo processo político em Portugal parece-me ser compensado pelo interesse noutros aspectos, como nestas festividades portuguesas, ou inclusivamente pelo futebol, mas claro que aqui o interesse está muitas vezes dependente dos resultados da equipa.
OEm - (risos). E neste momento dir-nos-á que a emigração continua activa? Ou a crise mundial pode estar a afectar...?
JCA – É muito complicado conseguir dados para medir não só os stocks, mas também os fluxos migratórios. E, como disse, as diferentes fontes têm problemas específicos e normalmente os números são muito diferentes de fonte para fonte. Mas, mais uma vez, os NINo, ou National Insurance Number Registrations - que por acaso vocês até têm alguns desses dados no vosso website - são, nesse aspecto, muito úteis e permitem ter uma ideia aproximada sobre o que se passa. E o que estes dados denotam é que depois do grande aumento do início dos anos 2000, houve como que uma estabilização até ao ano passado. E esta consolidação foi sempre muito acima dos anos 1990. Por exemplo, a partir de 2003, 2004, houve sempre mais de dez mil registos anuais, quando nos anos 1990 nunca ultrapassaram os cinco mil. E o que é curioso é que, apesar desta crise que se vive no Reino Unido, e de aparentemente o país ter deixado de ser um país tão atractivo, não só pela crise mas também pela desvalorização da libra e pela maior competitividade com a mão-de-obra dos países de Leste, o que é facto é que no ano que acabou em Abril de 2009 houve um grande novo aumento de mais de 25% dos registos, comparando com o ano anterior. E este foi mesmo o ano em que houve mais registos de nacionais portugueses, desde que estes dados existem, ou são publicados. Claro que nem todos os novos registados serão emigrantes recém chegados. Mas a maioria creio que sim. E portanto, apesar de alguma estabilização e destes factores adversos da crise económica, o Reino Unido parece continuar a ser procurado por muita gente que vem à procura de trabalho e, no fundo, à procura de uma vida melhor.
OEm - Então, parece-lhe que a crise não afectou esta emigração que se iniciou nos anos 2000?
JCA – Realmente, a avaliar pelos dados dos registos do número de segurança social, que é um número que toda a gente que trabalha,ou que pensa vir a trabalhar, aqui no Reino Unido, necessita, não. Eu tenho colocado essa questão também a muitos membros da comunidade e a community workers. E a resposta parece ser que não tem havido um impacto pelo menos tão significativo como poderia ser de esperar. E o que estes dados também denotam é que o decréscimo que se previa depois da grande explosão dos anos 2000 não se verificou, houve apenas uma estabilização dos números. E agora houve um novo disparo. Se isto é uma tendência para ficar, ou não, creio que precisaremos de mais alguns dados para avaliar.
OEm - E tempo, também...
JCA – E tempo, exactamente. Mas eu creio que isto também se deve à falta de alternativas ao nível de emprego em Portugal.
OEm - Mas esse efeito também podia sentir-se ao contrário, a crise ter impacto no Reino Unido...
JCA – Sim, e realmente a crise teve impactos muito importantes, sobretudo nalguns sectores como a indústria automóvel. A competitividade pelos trabalhos em que os portugueses normalmente se concentram também aumentou, não só entre os vários grupos imigrantes mas também com os trabalhadores ingleses. Recordem-se, por exemplo, os protestos do ano passado de trabalhadores ingleses que reclamavam trabalhos britânicos para trabalhadores britânicos, a propósito do caso da refinaria de Lindsay em que estavam envolvidos trabalhadores portugueses. Mas noutros sectores como a agricultura ou processamentos de carnes e comida, o impacto não parece ter sido tão importante.
Mas vamos esperar por mais dados para ver se de facto este aumento foi uma vez só, ou se é, de facto, algo mais estrutural.
OEm - Os portugueses sentem algum tipo de dificuldades ou receios?
JCA – Eu creio que as dificuldades económicas sentem-se também aqui. Também, com a maior competitividade ao nível dos empregos com outras populações migrantes a procurarem o Reino Unido, etc., o desemprego é talvez a maior ameaça e a maior fonte de inquietude para esta população imigrante não qualificada ou muito pouco qualificada.
Como citar Pinho, Filipa (2010), "Recrutamento de empresas do Reino Unido em Portugal. Entrevista a José Carlos Almeida", Observatório da Emigração, 20 de Janeiro de 2010. http://www.observatorioemigracao.pt/np4/4711.html