Tal como a maioria dos governos europeus, o Governo português chega a Bruxelas com a convicção firme de que um adiamento da questão britânica será uma machadada perigosa na resolução do acontecimento político que, porventura, mais põe em risco o futuro da União Europeia. O espírito do primeiro-ministro será de compromisso. Mesmo assim, na questão mais difícil para Portugal, das condições para os imigrantes europeus que Cameron quer endurecer, o Governo ainda não estava na quarta-feira satisfeito com a penúltima redacção de Donald Tusk para os líderes apreciarem. Houve uma versão final ontem à noite. António Costa considera que as condições que permitem a Londres accionar uma "travagem de emergência" traduzida em redução dos apoios sociais aos emigrantes europeus ainda não é suficientemente "excepcional, temporária e limitada", explicaram ao PÚBLICO fontes próximas do seu gabinete. Ou seja, o que está escrito, depois das negociações de Tusk ainda é demasiado vago para ser facilmente aceite. Esta é, porventura, a questão mais complicada para o primeiro-ministro, dado o número crescente de emigrantes portugueses que têm como destino o Reino Unido.
O Governo também não está totalmente confortável com as concessões feitas a Londres no que toca às decisões da zona euro (o pilar da governação económica). O primeiro objectivo de Cameron é garantir que a regulamentação europeia para os mercados financeiros não possa prejudicar a City. O Governo português alinha com a posição francesa, ela própria bastante minoritária, mas com o apoio implícito da Alemanha, considerando que é preciso ressalvar qualquer capacidade de bloqueio britânica às decisões da moeda única. A última versão conhecida já responde à questão de saber se o euro é "a moeda europeia" ou, como quer Cameron, uma das moedas europeias, favorecendo a definição do primeiro-ministro britânico. De resto, não há problemas em matéria de competitividade: toda agente quer uma União menos burocrática e mais competitiva; nem qualquer problema no capítulo da soberania.
Em Lisboa como, de resto, na maioria das capitais europeias, há a compreensão de que existe uma janela para resolver rapidamente o caso britânico que, se falhar, se pode arrastar por muito tempo e com um clima bastante mais negativo de ambas as parte. Ontem, a apreensão da delegação portuguesa estava também no risco de David Cameron se apresentar com novas exigências, em função da (má) recepção que as suas propostas estão a ter no seu país, mas também na percepção de que os outros líderes europeus querem mesmo o Reino Unido dentro da Europa. Incluindo Portugal. Costa resumiu claramente a posição de fundo na sua visita recente à chanceler alemã, lembrando a mais velha aliança do mundo (o Tratado de Windsor, seculo XIV) que faz com que Portugal só consiga ver a Europa quando está lá o Reino Unido. É uma questão de interesse nacional. Este é o ponto de partida. Costa não vai para Bruxelas com qualquer intenção de bloquear um acordo mas apresentará "com firmeza" as suas preocupações, quase todas centradas nos direitos dos imigrantes europeus. Portugal está a viver um novo surto de imigração para o Reino Unido em consequência da crise e do desemprego, que tem dado visibilidade sobretudo às pessoas com altas qualificações (enfermeiros, médicos, informáticos, engenheiros) que empurrou para fora do país gente muito qualificada. Mesmo assim, a emigração com baixas qualificações ou sazonais representa ainda a maioria de quem já imigrou ou está a imigrar para lá.
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