Diz um ditado grego que "bem começado é meio caminho andado", resta saber se o arranque do novo Executivo helénico foi dado na direção certa. Em doze dias após a vitória do Syriza nas eleições gregas, o primeiro-ministro Alexis Tsipras e o ministro das Finanças Yanis Varoufakis anunciaram uma série de medidas que alimentam a esperança do povo grego e fizeram disparar o alarme dos parceiros europeus.
Entre as reuniões dos dois governantes na Europa houve alertas e recuos, pelo que a pergunta se impõe: têm ou não os gregos razões para estar otimistas? Segundo quatro emigrantes portugueses ouvidos pelo Expresso, ainda é "prematuro" fazer balanços, sublinhando, contudo, que a situação económica grega não vai mudar de um dia para outro.
"Ainda é um pouco cedo para tirar conclusões. Em regra geral não diria que concordo com todas as propostas, embora a situação do país estivesse de facto muito precária. É porém uma diferente forma de ver e fazer política, que é bem-vinda", diz Pedro Andrade, de 37 anos.
De acordo com este consultor informático, que vive há 13 anos em Atenas, os gregos mostraram-se ainda mais otimistas desde o início desta semana face à possibilidade de ser possível alcabçar um novo acordo com os parceiros europeus. Pedro sustenta que a "sede de mudança" e "o sentimento de esperança" dos gregos criam por vezes "ilusões desmedidas" que podem acabar por não confirmar-se à velocidade que mostram as reuniões dos governantes gregos no seu périplo europeu.
"Ao contrário dos gregos, devo dizer, muito honestamente, que não estou nada otimista em relação ao novo governo. Não tenho confiança no novo primeiro-ministro, apesar de reconhecer que tem algumas ideias positivas, porque muitas pessoas vão travar as suas intenções", afirma por seu turno Alexandra Psarris, frisando que o povo grego estava farto da austeridade e precisava urgentemente de uma cara nova fora dos partidos da maioria.
Casada com um grego, Alexandra, de 41 anos, vive em Atenas desde 2002 e sentiu na pele os efeitos da crise. Até 2010 trabalhou como investigadora científica em dois institutos no país, mas ficou sem emprego face aos cortes na investigação. Atualmente trabalha como operadora num call-center em Palaio Faliro, nos arredores de Atenas, a cerca de seis quilómetros a sudoeste da capital, 20 minutos de carro.
"Acredito que os gregos estivessem tão saturados como eu com tantos sacrifícios, mas sei que tenho uma visão diferente da população em geral. Estou bem mais cautelosa", realça.
Voto de protesto contra a austeridade
Também Mónica Carlos, que reside há 17 anos na capital helénica, se mostra prudente quanto ao novo cenário político. "Considero que os eleitores gregos decidiram mudar, pelo menos de líderes, em honra de uma democracia que hoje é estritamente eleitoral e depois de um cansaço económico e psicológico extremo, após mais de oito anos de austeridade sem resultados, tanto na redução da dívida como na ultrapassagem de uma recessão económica profunda", diz.
"De qualquer forma, para além da mudança da equipa governamental, na prática nada muda pois os problemas continuam por resolver", destaca ao Expresso esta portuguesa de 46 anos.
Para a responsável de Comunicação e Gestão de Sustentabilidade Corporativa de uma empresa em Atenas, é de ressaltar, contudo, o facto de já ser "positivo" que no "espaço de duas semanas se tenha criado um clima renovado de diálogo substancial sobre a dívida grega com uma proposta específica e fundamentada."
Mas o melhor no novo panorama político, defende Mónica, será o facto de "abrir-se a vida política a uma nova geração não descendente de nomes como Papandreou, Karamanlis e Mitsotakis, e eventualmente, com este outro qualquer Governo, à despartidarização do Estado e do sector público".
Já Paulo Mixalakis, cidadão luso-grego de 47 anos, que trabalha há três décadas no sector marítimo em Atenas, mostra-se cético em relação aos planos gregos. "O governo de Tsipras prometeu e continua a prometer muita coisa, mas não depende só dele, mas dos parceiros europeus, nomeadamente da vontade de Berlim. Penso que obviamente vai cumprir alguma parte do que prometeu, mas não acredito em grandes mudanças", opina.
Segundo ele, só daqui a seis meses é que poderá começar-se a avaliar o trabalho do novo executivo. "Duas semanas após a vitória do Syriza nas eleições ainda é prematuro fazê-lo, é tudo muito recente. Houve, de facto, uma deslocação de pessoas da direita e do centro que votaram em Tsipras como castigo. Mas face à coligação do partido da esquerda radical com o partido eurocético de direita Gregos Independentes, só podemos perguntar: quanto tempo de vida vai ter este governo? Dois ou três anos?", questiona.
Grécia não sai do euro
Ainda que não acreditem que a Grécia saia do euro, os quatro emigrantes portugueses em Atenas admitem deixar o país nesse cenário. "A comunidade lusa na Grécia será afetada de forma diferente dos gregos, uma vez que a maior parte das pessoas não são emigrantes por razões económicas, como acontece em França ou na Alemanha. Na generalidade, estão todos bem integrados na sociedade; se a economia melhorar irão beneficiar, mas se a Grécia, hipoteticamente, sair do euro, alguns vão considerar, certamente, sair do país", defende Pedro Andrade.
Alexandra Psarris também considera pouco provável que o país que a acolhe abandone a zona euro, uma vez que a Grécia está num "ponto estratégico" e mantém boas relações com árabes e russos. "Mas se acabar por sair do euro vamos embora. O meu próprio marido diz isso. Quando se tem filhos pensa-se mais. Não será certamente do turismo que o país vai sobreviver. Nestes anos de crise fecharam-se muitas fábricas e com a Grécia isolada a economia irá desgraçar-se ainda mais", reforça.
A Grécia sair do euro? "Não acredito", responde de pronto Paulo Mixalakis, acrescentando que o país é alvo de muitos interesses no Norte de África e no Médio Oriente, devido a recursos como o petróleo e o gás.
A zona da moeda única vai continuar com a Grécia, porque "ela própria quer, bem como a Alemanha, os EUA e a China. Acho ainda que nos próximos anos o caminho da Grécia e Portugal irá cruzar-se muitas vezes, podendo ser rico em lições para ambos os países", sustenta Mónica Carlos.
Sublinhando que os gregos estão cansados de "décadas de polarização política e pilhagem do Estado", Mónica defende que a "engenharia financeira" poderá ajudar este e outros países europeus. "Mas o mais importante para a Grécia, para Portugal, e pondo a hipocrisia de lado para a própria Europa, na minha opinião não é a dívida mas sim o outro grande problema que é o crescimento económico", remata.
A Grécia conta com cerca de 700 emigrantes portugueses, sendo que a maioria não se mudou para o país por necessidades económicas, em busca de emprego, segundo os dados oficiais.
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