Ao avançar para a requisição civil, o Governo veio reconhecer que a TAP não é uma empresa como as outras. Em quantas empresas não estratégicas é que o Governo decretou a requisição civil? Em nenhuma, claro. E essa é a maior prova, por um lado, da centralidade da empresa para a economia e, por outro, dos perigos decorrentes da sua privatização.
O mesmo governo que avança para a requisição civil na TAP, alegando a sua importância estratégica para a economia e para os emigrantes que "não têm alternativa para se deslocarem a Portugal", quer privatizar a operadora aérea nacional e não tem pejo em colocar em causa a presença da TAP junto das comunidades portuguesas.
Não julguem que é exagero ou cliché. Nem é preciso irmos muito longe. Olhemos aqui ao lado, para o que aconteceu depois da privatização da Iberia. Uma das primeiras decisões dos novos donos foi a supressão de rotas históricas, essencialmente na América Latina. Olhemos para trás. Se, no início da década, Guterres tivesse vendido a TAP à Swissair, hoje a TAP faria parte de uma empresa falida.
Diz o Governo que avança com uma requisição civil, de contornos legais mais do que duvidosos, para assegurar a tranquilidade do natal de milhares de famílias. E a reunião familiar natalícia no próximo ano, quem a protege se a empresa for privatizada a um qualquer fundo abutre? E no ano seguinte? E daqui a 10 anos? Quem é que a protege? Os trabalhadores em greve.
Os argumentos do Governo não se aguentam dois segundos porque o interesse desta privatização, feita à pressa e quando o Governo está em fim de mandato, não tem nada a ver com critérios económicos, de eficácia ou gestão. É o fanatismo ideológico de quem é contra tudo o que é público e aí encontra uma oportunidade de negócio.
Nunca é demais lembrar a importância da TAP. É a companhia que fala a nossa língua onde quer que estejamos. É a companhia que junta o continente às ilhas e o país todo aos seus emigrantes. É a companhia que, sempre que há portugueses em risco em qualquer canto do mundo, os vai resgatar em segurança. Isto acontece porque é uma empresa nacional de capitais públicos.
Todos estes serviços estarão em causa com a privatização da empresa. Que interesses manterão os capitais sabe-se lá de onde na ligação às ilhas ou aos países onde temos comunidades emigrantes? Aí já não interessa o Natal e o impacto dos emigrantes na economia nacional?
Claro que o Governo nos vai dizer que, no fabuloso acordo de serviço público que irá assinar, vai garantir que os interesses dos cidadãos vão ser acautelados. Na verdade já disse isso com a ANA ou com os CTT. O que é que aconteceu? No primeiro caso as tarifas aéreas subiram várias vezes num ano, aumentando 33%, enquanto os correios se entretêm a tentar impingir créditos ao consumo com juros abusivos e insustentáveis.
O governo tenta intoxicar a opinião pública, apresentando-se como o defensor da reunião familiar contra os madraços dos trabalhadores apresentados como inimigos dos interesses nacionais. Nada mais falso. O governo é responsável pela emigração, sim. Mas quem protege o que é nosso, e o nosso futuro como entidade coletiva, são os trabalhadores da TAP que se unem em greve. Merecem o nosso respeito. E apoio.
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