A
investigadora Elsa Lechner, que estuda o fenómeno de emigração portuguesa há
cerca de 20 anos, diz que «em Portugal há um claro preconceito das elites em
relação aos emigrantes».
Um dia depois de o governo ter apresentado na Assembleia da República o Relatório
da Emigração, que garante terem saído mais de 95 mil pessoas do país em 2012, a
investigadora diz que «o discurso dominante em Portugal tem sempre veiculado
uma visão distorcida dos emigrantes», na qual dominam «os estereótipos e
preconceitos».
«Agora, diz-se que os emigrantes portugueses são todos diplomados, caindo-se
numa glamorização da nova emigração. Mas é um erro. Antigamente, dizia-se que
os emigrantes eram todos pobres, analfabetos e rudes. Também está errado»,
explica a cientista.
Lechner, que é investigadora Principal no Centro de Estudos Sociais da
Universidade de Coimbra, explica que estes preconceitos resultam de um
«conhecimento incompleto das realidades da emigração portuguesa e, sobretudo,
de um abismo entre a elite intelectual e política e as classes populares».
«Há um divórcio entre as experiências concretas vividas e protagonizadas pelos
homens e mulheres que saem do país em busca de um trabalho, de melhores
condições de vida ou da simples sobrevivência, e as ideias abstratas das elites
sobre essas mesmas experiências. Em relação à diáspora portuguesa, esse
divórcio é muito evidente», diz, acrescentando que «ninguém ganha com isso, nem
as classes dominantes, nem os emigrantes, nem o país».
Lechner, que está a estudar a comunidade portuguesa em Newark, e que já estudou
os portugueses em França, afirma que muitos dos seus interlocutores referem com
mágoa a rapidez com que são catalogados de cidadãos de segunda ou terceira
classe por quem não teve de passar pela emigração.
«Os emigrantes queixam-se. Têm uma magoa profunda pela falta de reconhecimento,
sentem que só são respeitados quando há vantagens financeiras ou eleitorais
envolvidas», como cita a Lusa.
Neste momento, Lechner estuda a comunidade portuguesa de Newark, no estado norte-americano
de Nova Jérsia, como investigadora Fullbright/Instituto Camões associada às
Universidades de Brown e Rutgers.
A investigadora diz que o fluxo emigratório para os Estados Unidos, embora
menos evidente do que nos anos 70 e 80, continua a existir.
«O controlo estatístico é difícil, mas o que vejo no terreno são jovens que
chegam todas as semanas», conta, garantindo que «também estão a chegar famílias
inteiras».
A maioria destes portugueses, devido às restritivas leis do país, encontram-se
em situação irregular passados três meses, quando termina o visto de turista.
«Estas pessoas encontram trabalho muito facilmente e não ganham mal. Mesmo a
servir às mesas ou a lavar pratos, ganham muito melhor do que se estivessem em
Portugal. Fazem numa semana o que faziam em Portugal num mês, mas sentem-se e
estão, de facto, muito vulneráveis», explica.
Lechner iniciou este trabalho em fevereiro. Os dados recolhidos farão parte de
um projeto a cinco anos que pretende comparar as comunidades de Newark, Paris e
São Paulo e, transversalmente, a nível geracional, região de origem e género.
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