por Paula Telo Alves, da agência Lusa
Um ano depois do despejo de 14 portugueses de uma residência social para
imigrantes com dificuldades económicas no Luxemburgo, a casa continua
desabitada, enquanto alguns antigos residentes vivem em condições
precárias.
Na altura, a então ministra da Integração alegou que precisava do espaço para alojar refugiados, mas a Lusa confirmou esta semana que a casa continua vazia.
Manuel Landeira, de 55 anos, chegou ao Luxemburgo há quatro e foi um dos 14 portugueses que receberam a carta de despejo do Gabinete Luxemburguês de Acolhimento e Integração (OLAI) em Outubro do ano passado.
A carta dizia que iam todos ter de sair até Dezembro para dar lugar a "outros estrangeiros recém-chegados ao Luxemburgo", incluindo requerentes de asilo.
Os portugueses protestaram, o prazo foi alargado até à primavera e o Governo prometeu realojar os imigrantes carenciados, mas Manuel Landeira diz que as promessas não se concretizaram.
A carta dizia que os residentes viviam na residência social "há mais de três anos", mas Manuel Landeira tinha chegado há pouco mais de um ano.
Como estava há menos de três anos no Foyer -- um prazo decidido pelo OLAI sem base legal --, ainda lhe propuseram um quarto no Foyer de Mülhenbach, mas Manuel recusou. "Ao fim de um ano tinha de sair outra vez, como estão a fazer com os outros agora, e quando pude arranjei outra coisa", explica.
O português foi um dos últimos a deixar o "Foyer de Bonnevoie", nos arredores da capital luxemburguesa, e está revoltado. A viver desde Abril num quarto duplo com outro dos homens que tiveram de deixar a residência, o carpinteiro de cofragem indigna-se: "Eles puseram as pessoas na rua e têm a casa vazia!".
No local onde agora vive, Manuel paga 350 euros por um quarto duplo, um entre as centenas de quartos por cima de cafés e mercearias na capital luxemburguesa onde vivem muitos imigrantes portugueses.
Divide o chuveiro com mais quatro homens e faz a comida num barracão sem aquecimento, equipado com um fogão velho com quatro bocas, um armário partido e uma mesa.
É preciso passar pelas traseiras, a céu aberto, para chegar à cozinha, e quando chove os sete homens que vivem na casa, todos portugueses e cabo-verdianos, chegam lá encharcados.
"É muito duro. Eu nunca pensei na minha vida passar o que estou a passar", disse à Lusa o imigrante português, que deixou a mulher, as filhas e duas netas para vir para o Luxemburgo, depois de o patrão ter deixado de lhe pagar o salário pelo quarto mês consecutivo. "Tive de vir à vida, como os outros".
Desde a falência da empresa de construção Soccimo, em 2011, que deixou 420 imigrantes portugueses no desemprego, Manuel nunca mais teve um contrato fixo. "É de semana a semana, quatro contratos por mês", a ganhar "entre 1.600 e 1.700 euros limpos", diz.
Um valor que faz dele um "trabalhador pobre" -- uma categoria que abrange dez por cento da população no Luxemburgo, onde o limiar de pobreza é de 1.639 euros, segundo o Statec, o gabinete de estatísticas luxemburguês.
Para agravar a situação, Manuel teve um acidente de trabalho na semana passada e teve de levar seis pontos na testa.
"Estou cá há quatro anos e nunca andei no 'chômage' (desemprego) nem doente. Já fui pedir ao meu encarregado se me deixava voltar ao trabalho antes de tirar os pontos, mas não me deixam. Isto é uma cadeia para mim", disse, a percorrer o quarto com os olhos.
O caso do abandono do Foyer de Bonnevoie foi denunciado esta semana pelo semanário Contacto, e já levou o partido luxemburguês Déi Lénk a anunciar que vai questionar o Governo após as eleições legislativas do próximo domingo, quando o parlamento retomar funções.
Para o Déi Lénk, o abandono daquela residência numa altura em que há um novo despejo no Foyer de Mühlenbach, onde vivem 90 portugueses, é "incoerente e incompreensível".
"São pessoas que estão no fundo da escala social, que ganham o salário mínimo e têm contratos temporários, com os quais não é possível arrendar sequer um apartamento. Arrendar um estúdio custa entre 800 a mil euros, sem falar na caução de dois meses e na comissão de agência de um mês que é preciso pagar", explicou o porta-voz do Déi Lénk, David Wagner.
A Lusa tentou ouvir a directora do OLAI sobre a razão para o Foyer de Bonnevoie continuar desabitado, mas Christiane Martin não respondeu às questões.
Lusa/SOL, aqui.