por Filipa Parreira, da Agência Lusa
Ao fim de 15 anos praticamente esquecida, a emigração voltou à ribalta com a crise de 2008. Para o coordenador do Observatório da Emigração, esta atenção deve-se mais ao perfil daqueles que emigram e menos aos números.
"Finalmente chegou às famílias que contam (...) Isto é, chegou aos 'nossos'. Já não são só 'eles' que emigram", disse o coordenador científico do observatório, Rui Pena Pires, durante um debate sobre "A actual situação migratória de Portugal", esta semana em Lisboa.
Afirmando não querer ser cínico, o investigador admitiu ser essa a sua explicação para a percepção do aumento da emigração num momento em que, dizem os números, ela está a cair.
Segundo os dados do Observatório, a emigração portuguesa aumentou até 2007 - saíram nesse ano 59.912 pessoas para Espanha, Suíça, Reino Unido, Alemanha e Holanda - mas começou a cair em 2008 (53.710) e o declínio prosseguiu até 2011 (43.225), último ano de que há registos.
Isto acontece, explicou, porque a crise não foi exclusiva de Portugal e o desemprego afectou praticamente todos os países desenvolvidos, nomeadamente os tradicionais destinos da emigração portuguesa.
Rui Pena Pires negou também que se registe um aumento proporcional da emigração de quadros qualificados: "Sempre emigraram quadros em Portugal. Agora emigram em maior número porque há mais quadros do que há 20 anos", disse.
Para o investigador, a emigração tem hoje uma visibilidade que não tinha porque, "pela primeira vez, a necessidade de emigração chegou a grupos sociais com maior qualidade de vida, mais acesso a informação, maior influência e, por isso, passou a ser um problema público".
Antes disso, entre os anos 1990 e o início da crise, a emigração esteve praticamente esquecida, tanto da política como da academia, disse por seu lado, no mesmo evento, o investigador do Centro de Estudos Geográficos da Universidade de Lisboa Jorge Malheiros.
Admitindo que a justificação para esse "esquecimento" seja o aparecimento do fenómeno da imigração, que "era novidade" e de que pouco se sabia, Malheiros defendeu que isso não explica que durante uma década e meia se tenha estudado tão pouco a emigração - sobretudo quando se sabe que "as saídas nunca desapareceram".
Os números do Instituto Nacional de Estatística - que pecavam por defeito - apontavam para mais de 20 mil saídas por ano.
Além disso, embora até há quatro ou cinco anos o saldo migratório tenha sido favorável a Portugal - entrava mais gente do que saía - o número absoluto de portugueses no exterior (que varia entre 2,5 e quatro milhões consoante a fonte) sempre ultrapassou largamente o número de estrangeiros em Portugal (500 ou 600 mil), explicou depois aos jornalistas.
Também nas remessas, o peso da emigração sempre foi maior, lembrou o investigador: embora o fluxo de saída de remessas tenha crescido sempre, as entradas foram sempre maiores do que as saídas.
"Nunca deixámos de ser um país de emigração, qualquer que seja a medida", afirmou.
Porquê, então, o foco na imigração? Porque havia a noção, defendeu Malheiros, de que a emigração era um fenómeno "do Portugal atrasado, antigo".
"Havia um certo apagamento do imaginário do emigrante da mala de cartão que vai para fora porque não tem oportunidades num país pobre", disse o investigador, lembrando que a imigração "foi uma boa notícia para Portugal".
"Foi provavelmente o período em que Portugal viveu mais feliz. (...) Tínhamos obras públicas, festas nacionais, Expos, campeonatos de futebol, taxas de desemprego baixíssimas e muitos imigrantes", lembrou.
Hoje, lamentou, o discurso político passou de um extremo ao outro. Da negação da emigração para o seu elogio: "Não há alternativas em Portugal e por isso é normal emigrar".
O problema, sublinhou, é que "quando não há alternativa dentro [do país], a emigração deixa de ser uma opção. É a única saída".
Lusa/SOL, aqui.