A comunidade portuguesa da África do Sul, calculada em cerca de 400 mil pessoas de quatro gerações, tem um enorme potencial humano e económico, mas os governos de Lisboa sempre o desperdiçaram, afirma um dirigente comunitário.
Em vésperas de uma visita, no sábado, a Joanesburgo do Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, Manuel Ferreirinha, presidente do Fórum Português da África do Sul, disse à Lusa que os sucessivos governos portugueses das últimas décadas "escolheram sempre mal os seus interlocutores no seio da comunidade, ignorando quase sempre os que mais valia têm na economia e na sociedade", e isso originou um quebrar dos laços entre a comunidade e Portugal e as suas diferentes regiões.
"Que não restem dúvidas sobre a forte influência dos portugueses na sociedade e na economia sul-africana nem sobre o orgulho que têm nas suas raízes. É uma comunidade brilhante, admirada por todos, mas esquecida durante muito tempo pelos governos de Lisboa ", garantiu Ferreirinha, um luso-descendente com empresas em várias áreas, designadamente nas ferragens, materiais de construção e segurança.
Desde que foi fundado, em 2001, o Fórum Português tem tentado colmatar a falta de coesão e ligação entre os portugueses e lusodescendentes que residem no vasto território sul-africano, criando uma estrutura representativa da comunidade portuguesa em dezenas de cidades e vilas do país, atuando na área da prevenção da criminalidade com os comerciantes, de ligação com as autoridades sul-africanas e com as autoridades consulares portuguesas.
"Esse trabalho tem sido muito produtivo e os resultados estão bem consolidados. E vemos com satisfação que as autoridades portuguesas, em particular do Governo Regional da Madeira, que nos visitaram recentemente, finalmente, iniciarem um diálogo inclusivo, com todas as forças vivas da comunidade, e a abrirem canais de comunicação connosco", concluiu aquele dirigente.
Os portugueses da África do Sul têm forte participação em todas as áreas da economia, deste a metalomecânica, onde alguns possuem empresas de dimensão significativa, aos transportes, retalho e produção e distribuição alimentar.
Os profissionais de origem portuguesa destacam-se nas áreas da saúde, da advocacia, arquitetura e tantas outras, mas muitos dos que têm notoriedade, quer no empresariado quer nas suas profissões, estão afastados da comunidade e das suas estruturas associativas.
As alterações sociopolíticas operadas nas duas últimas décadas no país de acolhimento e a ausência de uma transição entre as gerações mais antigas e os jovens na liderança dos clubes e associações são apontadas unanimemente como as causas desse afastamento.
Alexandre Santos, presidente da Federação das Associações Portuguesas na África do Sul, lamenta o encerramento recente de mais um dos grandes clubes da comunidade, a União Recreativa, Desportiva e Cultural, que durante décadas promoveu modalidades como o futebol, o basquetebol e o hóquei em patins em Joanesburgo.
O responsável admite que a "morte lenta do associativismo" é um sinal dos tempos e das divisões na comunidade, mas não deixa de assacar responsabilidades aos governos de Lisboa.
"Continua a haver entre a comunidade a perceção de que os governantes portugueses só se lembram dos que vivem longe quando precisam do seu voto ou das suas remessas de dinheiro, e a atitude não tem mudado muito ao longo dos anos", afirmou.
"O 10 de Junho deste ano foi disso um bom exemplo: a comunidade comemorou nos clubes o Dia de Portugal sem que o país tivesse cá um embaixador há 3 meses, sem um cônsul-geral em Joanesburgo mais ou menos ao mesmo tempo, e sem que nenhum membro do governo se tivesse dignado a visitá-la", concluiu o dirigente.
Diário de Notícias da Madeira, aqui.