A mesma pena foi aplicada a Laurentino Freire dos Santos, o segundo português a integrar o grupo brasileiro conhecido como Máfia dos Bingos, que levou à condenação de 24 pessoas, entre as quais vários juízes, empresários e advogados, pelos crimes de tráfico de influência, corrupção passiva e activa, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro através do jogo ilegal conhecido como "jogo do bicho".
Licínio Bastos é o dono da sede do PS no Rio de Janeiro e surgiu como o principal financiador do candidato socialista ao círculo Fora da Europa nas legislativas de 2005, Aníbal Araújo. Na altura, a escolha deste candidato desagradou à Federação do PS no Brasil e levou mesmo à demissão de alguns militantes que, em carta dirigida a José Sócrates, acusavam o deputado José Lello, mandatário da campanha, de ter "desautorizado e ignorado" as deliberações da estrutura brasileira. Algum tempo depois das eleições, em Maio de 2006, Licínio foi nomeado cônsul honorário de Portugal em Cabo Frio, a 150 quilómetros do Rio de Janeiro, por despacho do então secretário de Estado das Comunidades, António Braga. Assim que o Governo português soube que o cônsul estava a ser investigado pela polícia brasileira, suspendeu a sua nomeação, mas a exoneração do cargo só se verificaria em Setembro de 2007 e depois de o PÚBLICO ter denunciado os atrasos na exoneração. Posteriormente, António Braga alegaria que desconhecia "qualquer mácula" no currículo do empresário português, cujo nome teria sido "escolhido pela comunidade".
Além de possuir empresas de transportes, clínicas médicas e dois motéis, Licínio Bastos teve várias ligações a casas de bingo. Numa das escutas telefónicas registadas pela polícia brasileira, o candidato cuja campanha Licínio financiara surgia referenciado, juntamente com António Braga, como estando a mover influências para convencer "um presidente de câmara do PS" a desembargar uma obra. As ligações desta Máfia dos Bingos a Portugal e a elementos do PS, alegadamente para expandir o negócio dos bingos e casinos a Portugal e Macau, chegaram a motivar queixa à Interpol.
Na sentença emanada da 6.ª Vara Federal do Rio, a juíza Ana Paula Carvalho qualifica Licínio Bastos e Laurentino dos Santos como "homens de segundo nível" da organização mafiosa que dominava a exploração do jogo ilegal em todo o estado do Rio de Janeiro, mas com "culpabilidade elevadíssima". O dinheiro ilícito do jogo era depois "lavado" na economia formal através "de inúmeras empresas, de restaurantes e hotéis a transportadoras e clínicas médicas". Além dos 40 anos e seis meses de prisão, cada um dos réus foi ainda condenado ao pagamento de 15.780 salários mínimos. Os portugueses foram detidos na primeira fase da investigação mas beneficiaram depois de um pedido de habeas corpus. Quando este foi revogado, recusaram apresentar-se às autoridades, tendo sido dados como foragidos. Posteriormente, o Supremo Tribunal Federal viria a confirmar o habeas corpus, pelo que estes continuam em liberdade. É nessa condição que deverão recorrer da pena para o Tribunal Regional do Rio de Janeiro, conforme adiantou ao PÚBLICO uma fonte da 6.ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro.
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