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Há portugueses a viver na Grécia que já só querem sair
2011-06-26
Jesualdo Ferreira chegou ao país já a crise tinha estalado. Os jogadores mais caros do Panathinaikos, o clube que treina, começam a ser dispensados.

lfredo Duarte Costa, embaixador de Portugal em Atenas, completou três anos em terras helénicas em Março. Diz que se vive um "pesadelo" na capital. Maria Piedade Maniatoglou, que está na Grécia há 30 anos, concluiu que o desastre financeiro era inevitável. E Carlos Ioannou, lusodescendente, pinta um quadro de desânimo entre os gregos. Quer emigrar.

São poucos, não mais de 400, os portugueses que vivem na Grécia. Pelos olhos deles, percebe-se que a tensão económica, política e social em que o país mergulhou arrastou a população para uma nova realidade. Violência, empresas falidas, pessoas fechadas em casa. A crise tornou-se a conversa do dia. E, apesar de haver agora mais hipóteses de o país continuar a receber financiamento de FMI e União Europeia, o futuro deixou de conter as expectativas do passado.

A próxima terça-feira é o dia do tudo ou nada. Vai a votação no Parlamento grego, o edifício que tem estado sob constante pressão dos manifestantes, no topo da Praça de Syntagma, o plano de austeridade que as autoridades externas consideraram suficiente para darem luz verde a um novo programa de assistência financeira, que se estenderá até 2014. Se o plano chumbar, a quinta tranche do empréstimo inicial, assinado em Maio de 2010, não virá e a Grécia arrisca-se seriamente a ir à bancarrota.

Independentemente do resultado, Atenas não vai escapar a novas vagas de contestação social. Já há greve geral convocada para terça e quarta-feira. Alfredo Duarte Costa, embaixador de Portugal desde Março de 2008, tem sido afectado pelas manifestações, porque vive e trabalha no centro do capital. "A rua já estava fechada à noite, por causa da insegurança. Mas, agora, está fechada também durante o dia. É um problema sair de casa", conta.

"Vive-se um verdadeiro pesadelo em Atenas, nas situações mais básicas do dia-a-dia. Muitos restaurantes e lojas fecharam. Quando cheguei, não previa uma situação destas. É muito grave", diz. Em Agosto, Alfredo Duarte Costa vai pôr um fim à carreira de 30 anos de diplomacia. Regressa a Lisboa "sem nostalgia", admite.

Não é o único a fazer planos para deixar a Grécia. Carlos Ioannou, um lusodescendente de 24 anos que acaba de completar a universidade, na área de turismo, também procura uma porta de saída. "Até há algumas saídas profissionais no sector, mas o país está virado ao contrário. Não há grandes esperanças em relação ao futuro", lamenta. Itália, França ou, quem sabe, Portugal são algumas das alternativas em cima da mesa.

"Estou a enviar currículos para todo o lado. Quero sair daqui", repete, enquanto retrata uma Grécia muito diferente daquilo a que se habitou. "Os gregos gostam de socializar. As esplanadas estavam sempre cheias. Havia festas, conversava-se. Agora fica tudo em casa a fazer contas ao futuro. É uma prisão financeira que acaba por ser psicológica", conclui. Os amigos, lusodescendentes ou não, também querem partir. 

Este é, aliás, um dos grandes riscos a prazo. Que a pressa de partir esvazie o país de população qualificada. O desemprego ronda os 16 por cento. Mais de 50 mil empresas faliram no último ano. E o novo pacote de austeridade vai deixar mais marcas.

Problemas crónicos

A contenção forçada também se faz sentir de forma particular. No clube que Jesualdo Ferreira treina, desde Novembro do ano passado, o Panathinaikos, também há um plano de emagrecimento de custos. "Os jogadores com grandes salários já saíram e há alguns que ainda vão sair", diz. E há estilhaços da crise que vêm de fora para dentro, como o "aumento da violência nos estádios, associada à tensão social", acrescenta.

Há quem aponte o dedo aos gregos, responsabilizando-os pelo estado a que o país chegou. Pela duvidosa gestão orçamental das despesas do Estado, pelos padrões de consumo desmesurados e pelas elevadas taxas de evasão fiscal, que continuam por controlar. "Uma fatia da população não está disponível para mudar de hábitos", explica Jesualdo Ferreira.

Este panorama tornou a instabilidade financeira um desfecho "inevitável", conclui Maria Piedade Maniatoglou, depois de 30 anos a viver no país. Chegou à Grécia com apenas 18 anos, trabalhou em várias empresas, deu aulas particulares e, hoje, dedica-se a terminar o segundo e último volume de um dicionário de português-grego para a Porto Editora. Sempre que consegue, vai reforçando os laços entre a reduzida comunidade lusa, através de uma associação cultural de que é presidente.

"As pessoas estavam habituadas a viver acima das suas posses. Uma situação que era fomentada pelos bancos, que facilitavam o crédito", diz. Além disso, continua muito presente a fuga ao fisco. "É um problema crónico, seja quando se vai a um consultório médico, quando se chama um canalizador ou se faz compras numa loja", conta. Com dois filhos, sabe que alguns portugueses perderam o emprego por causa da crise e outros viram o horário de trabalho e o salário reduzido. Mas está de pés colados à Grécia, por enquanto.    

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