Tóquio, 18 mar (Lusa) - Está apenas há três semanas no posto de embaixador em Tóquio, mas José de Freitas Ferraz nem teve tempo de se ambientar ao cargo antes de enfrentar uma tragédia de enormes proporções no Japão.
Mal tinha pousado as malas em Tóquio, o novo embaixador português sentiu a terra tremer e viu-se como notícia e fonte de notícias de alguns jornalistas portugueses que acabariam por chegar à capital nipónica, assumindo o papel de conselheiro e protetor da imprensa que tentava fazer o seu trabalho num cenário de destruição.
"Não havia tempo para ter medo", disse Freitas Ferraz à Lusa, ao relembrar aquele que foi um dos maiores tremores de terra de que há memória e que sentiu quando ainda procurava conhecer os cantos à capital japonesa.
A embaixada portuguesa tremeu tanto que Freitas Ferraz só pensava "quanto tempo aquela estrutura iria resistir", acabando por constatar, na primeira pessoa, que as "estruturas físicas do Japão estão de facto preparadas" para sismos.
"A minha preocupação era que as pessoas na embaixada não se aproximassem das coisas que estavam a cair, como os computadores e os telefones", disse o embaixador, que decidiu depois agarrar nos registos dos portugueses no Japão, avisar Lisboa do sismo e sair, com a sua equipa, da embaixada o "mais depressa possível".
"Não havia tempo para ter medo" nem para cruzar os braços e, por isso, José de Freitas Ferraz criou dois núcleos permanentes de apoio aos portugueses no Japão que têm funcionado na sua residência e na chancelaria praticamente 24 horas.
O embaixador, 61 anos, licenciado em História pela Universidade de Umea (na Suécia), e com uma carreira diplomática que o levou a Washington, Maputo, Madrid, Bruxelas e também Lisboa em diversos postos, inclusivamente em funções governamentais, tinha apenas um pensamento: a comunidade portuguesa e a sua segurança.
"A preocupação principal era a comunidade portuguesa, que segundo os nossos registos é formada por cerca de 450 portugueses, a maioria residente na zona de Tóquio", disse o embaixador, salientando que a prioridade foi o contacto com os portugueses que se encontravam na região de Sendai, afetada pelo tsunami, e com a cerca de meia centena de turistas nacionais.
Logo no sábado, o dia seguinte ao sismo, a embaixada portuguesa decidiu pedir o apoio do Governo japonês e da Cruz Vermelha para localizar uma portuguesa residente em Sendai, que afinal se encontrava a salvo no sul do Japão, para onde se tinha mudado sem avisar a embaixada.
O embaixador partilhou com os jornalistas a sua lista de contactos das autoridades japonesas e foi revelando aos que se deslocaram a Sendai as informações que lhe chegavam do Governo nipónico e respetivas recomendações, pedindo em troca para ser informado dos passos destes jornalistas no norte do Japão, para se certificar de que não corriam riscos.
José de Freitas Ferraz foi também servindo de porta-voz das outras embaixadas europeias, informando sobre as avaliações dos Estados-membros relativamente à situação da central nuclear de Fukushima e dos resultados das coordenações entre aqueles diplomatas.
Quando os problemas na central nuclear de Fukushima se agravavam, o embaixador aconselhava e apoiava os cidadãos portugueses a deixarem o Japão "se essa fosse a sua vontade", transmitindo-lhes as recomendações das autoridades japonesas até haver uma posição firme de Lisboa sobre as medidas a tomar, já que Portugal, ao contrário de outros países europeus, não tinha ainda uma avaliação de peritos em energia nuclear sobre a situação na central nuclear.
Agora, Freitas Ferraz continua no seu posto, fez uma "segunda ronda" de contactos com portugueses e diz-se "feliz" por não ter de reportar nenhuma vítima. Lamenta as perdas do Japão, um país que quer conhecer melhor e onde continua de pedra e cal no seu posto.
Lusa, aqui.