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Anthony de Sá: “A minha portugalidade está intrínseca nas minhas histórias”
2010-10-25
Filho de açorianos, Anthony de Sá cresceu no meio comunitário português de Toronto, mas as raízes portuguesas estiveram adormecidas durante vários anos. A redescoberta de uma herança cultural que hoje em dia assume como fundamental aconteceu há pouco tempo, e «Terra Nova» é a face visível desse regresso a essa portugalidade. Lançado no Canadá em 2008 com o título «Barnacle Love», o romance de estreia do escritor Luso-canadiano recebeu muito boas críticas no Canadá e nos Estados Unidos, tendo integrado as listas de vários prémios literários. Ver o livro editado em Portugal, foi uma sensação “muito especial”, como referiu nesta entrevista a O Emigrante/Mundo Português.

Sendo filho de portugueses, sentiu-se sempre «próximo» das suas raízes?
Os meus pais nasceram nos Açores, numa pequena aldeia chamada Lomba da Maia na, zona norte de São Miguel. Identifico-me como canadiano, mas não posso negar a importância que a cultura portuguesa teve no meu desenvolvimento. A minha «Portugalidade» está intrínseca nas minhas histórias. Faz também parte daquilo que eu sou e do que define a minha formação cultural. Através da historis de emigração pelos meus pais, das «lutas» que travaram e da solidão que sentiram, tentei recuperar, ainda que de forma ficcional, o que resta das minhas memórias. O que é interessante é que durante muito tempo na minha vida, estive afastado dessas mesmas raízes. E só agora sinto um verdadeiro estímulo para recuperar essa minha herança.

«Terra Nova» é uma consequência dessas suas raízes portuguesas ou foi uma forma de se aproximar delas?

«Terra Nova» foi inspirado pelo brutal assassinato, em 1977, de um jovem em Toronto, Emanuel Jaques. Foi a história que chamou a atenção do meu agente, mas tornou-se também a história em torno da qual as outras giravam. Houve a necessidade de perceber, através das histórias distintas de Manuel e Antonio, a família e as experiências sociais e culturais de pai e filho. Foi ao contar essas histórias, que comecei a redescobrir as minhas raízes.

Uma das crítica ao livro  afirmava que é "um excelente documentário sobre a emigração portuguesa". Dar a conhecer a comunidade no Canadá foi um objectivo?

Nem por isso. Eu quis simplesmente contar uma história que não tivesse ainda sido escrita na literatura canadiana. E ainda que retratasse fielmente a vida de um miúdo luso-canadiano que cresceu numa cidade como Toronto.

Fez alguma pesquisa para retratar as pessoas, a cultura e tradições portuguesas, ou as suas memórias e vivências foram suficientes?
Eu cresci numa casa com uma família grande, tanto nuclear como alargada. As nossas reuniões eram preenchidas com histórias sobre como tinha sido nascer e ser criado em Portugal, as memórias, os amores perdidos e o isolamento cultural que todos tinham sentido ao vir para o Canadá. Misturadas a esses sentimentos profundos, havia as histórias sobre o mar, a comida e os costumes. Histórias sempre vivas, coloridas e de alguma forma reais, até para mim.

Que reacções gostaria que o livro despertasse nos leitores, tanto no Canadá e nos EUA, como em Portugal?

O livro acabou de ser lançado nos Estados Unidos e as críticas foram maravilhosas, incluindo uma recente do «The New York Times». Espero ter conseguido chegar a um grupo alargado de pessoas que conhecem muito pouco do que é ser português. Gostaria que esses leitores vivenciassem as experiências de vida dos personagens, tanto os bons como os maus momentos. Mas gostaria também que abrissem os seus «mundos» para aceitar um grupo cultural que tem estado mal representado, durante muito tempo.

Foi algo especial ver o seu livro publicado em Portugal?

Muito mesmo. A Dom Quixote Publicações foi fantástica. Deu-me uma imensa satisfação ver membros da comunidade portuguesa a ler um livro que lhes é acessível.

Nelly Furtado comprou os direitos de adaptação do livro ao cinema. Gostaria de acompanhar este projecto?
Ela é uma grande artista e está apaixonada por esta história e pela possibilidade de a representar num filme. A sua visão será tão válida como a minha e estou animado para ver a interpretação que vai fazer da minha história.

«Carnival of Desire», é o segundo livro. Porque escrever sobre uma história trágica e real, que chocou a comunidade portuguesa em Toronto?
«Carnival of Desire» está em fase de edição. A história baseia-se no assassinato de um rapaz português de doze anos de idade, Emanuel Jaques, que era engraxador de sapatos. Em 1977 era um emigrante recente na cidade de Toronto, ele foi atraído por um homem, violado a brutamente assassinado. Esse acto mudou a cidade, mudou a forma como interagíamos como comunidade e as coisas nunca mais foram as mesmas.

Há já data para o lançamento de "Carnival of Desire»?
O livro será lançado no Canadá e nos Estados Unidos em 2011, a data exacta ainda não foi definida. A Dom Quixote ainda não adquiriu os direitos de tradução e publicação em português.

Depois de «Carnival of Desire», que se segue?
Ainda não sei ao certo, mas estou muito interessado no tema da África lusófona, num olhar pós-colonial ao que aconteceu a países como Angola e Moçambique. Realmente muito interessado.

Costuma visitar Portugal? O que é para si, ser luso-canadiano?

Recentemente, fui convidado a assistir algumas conferências em Lisboa e em São Miguel. E cada visita me aproxima mais de Portugal, no sentido de redescoberta de minhas raízes. Eu nasci no Canadá, filho de pais que eram açorianos e, portanto, essa é a minha herança. Mas tenho que «confessar»: apenas recentemente tornei-me cidadão português e assumi plenamente o orgulho de pertencer a um grupo que é parte fundamental daquilo que eu sou.

Filho de açorianos, Anthony de Sá cresceu na comunidade portuguesa de Toronto e aí vive com a mulher e os três filhos. Licenciado pela Universidade de Toronto e com uma pós-graduação na Universidade de Queen's, frequentou a Humber School for Writers, onde agora coordena o departamento de Inglês, para além leccionar Inglês e Escrita Criativa no liceu St Michael Power/Joseph High School. Com contos publicados em diversas revistas literárias norte-americanas, lançou em 2008 o seu primeiro livro, «Barnacle Love», que na edição portuguesa recebeu o título «Terra Nova». A obra foi uma das finalistas do prestigiado prémio literário canadiano «Scotiabank Giller Prize». Em Portugal, Anthony de Sá recebeu este ano o Prémio Talento 2009 na área da Literatura, atribuído pela Secretaria de Estado das Comunidades.

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