É o actual conselheiro
das Comunidades Portuguesas no Principado. Como caracterizaria a comunidade
portuguesa actualmente?
Hoje somos uma comunidade de quase 14 mil portugueses. Temos indicações de
regressaram a Portugal cerca de 400 portugueses, um número significativo.
O que causou o regresso?
A crise. A construção está muito parada, não há muito trabalho e a hotelaria
também está em crise. No turismo, o país de onde vêm mais turistas - Espanha,
principalmente da Catalunha - também está em crise. Mas tivemos um aumento
grande de turistas portugueses, que se notou na altura do Carnaval e na Páscoa.
Ainda há portugueses a emigrarem para Andorra?
Em 25 anos de residência em Andorra, foi a primeira vez que ouvi falar em
desemprego. Dizem que há aqui, cerca de 500 a 600 pessoas desempregadas. Algo que antes
era impensável, pelo contrário, havia falta de mão-de-obra. E agora há falta de
trabalho, uma coisa que é nova. Por isso, acho que Andorra não é um país para
se emigrar, neste momento.
Que apoios há em termos de segurança social?
Aqui não há fundo de desemprego porque também não há descontos. Não há fundo de
desemprego, não há 13º mês. Os descontos são para a assistência à saúde, para a
Caixa Andorrana de Segurança Social.
O sistema de saúde funciona bem?
É um bom sistema de saúde, não há listas de espera.
Quais são na sua opinião os problemas da comunidade portuguesa em Andorra?
Neste momento, o que
mais preocupa a comunidade portuguesa é a falta de trabalho. Toda a gente tem
receio de não poder pagar a renda do apartamento no final do mês, têm os filhos
para manter. E o nível de vida em Andorra é muito elevado.
O ensino da língua portuguesa é outra preocupação? Gostariam que fosse
uma língua de opção no sistema de ensino andorrano?
Isso está muito complicado. Eles já têm três sistemas de ensino: o catalão, que
é o oficial, e ainda o espanhol e o francês. Um sistema de ensino mais, será
complicado, mas não está descartado. Com o Embaixador Mário Damas Nunes, as
coisas estão a caminhar no bom sentido. Não é fácil, oxalá que fosse já no
próximo ano, é algo que estamos a reivindicar. Gostaríamos que o português
fosse integrado (no sistema e ensino). Seria muito importante para os nossos
filhos, mas também há pessoas que não são portuguesas, interessadas em aprender
a língua.
Durante a visita do Presidente da República a Barcelona, o Secretário
de Estado das Comunidades Portuguesas referiu a este jornal o projecto de
desenvolvimento de uma experiência piloto de introdução do ensino da língua
portuguesa em algumas escolas andorranas...
Há uma comissão criada que está a trabalhar sobre essa proposta, mas ainda não
está nada concretizado. O português é ensinado nas escolas andorranas, mas
suportado pelo Ministério da Educação, neste caso, agora, pelo Instituto Camões
no âmbito do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Temos mais de 600 alunos inscritos a aprender a língua portuguesa, dos 6 aos 17
anos. É um número bastante elevado, mas a verdade é que poderíamos ter muito
mais. Também há o ensino para adultos, havia mais de cem alunos inscritos, mais
andorranos e espanhóis que portugueses. Um apresentador da televisão andorrana,
Alfred Llahí, esteve a aprender português.
Acredita que haveria andorranos, crianças e jovens, interessados em
aprender português?
Creio que sim. A comunidade portuguesa é grande e o turismo português
aumentou e é de qualidade. Em dois anos, o turismo estrangeiro em Andorra que
mais aumentou foi o português. Sem esquecer que temos a quinta língua mais
falada no mundo. Por tudo isso, penso que estão interessados em aprender.
A comunidade foi abalada em Novembro do ano passado
pelo acidente nas obras do túnel de Dos Vallires, onde morreram cinco operários
portugueses. Como sentiu o apoio à comunidade portuguesa?
Éramos uma única comunidade: andorranos, espanhóis, franceses, portugueses. Era
um país que estava a sofrer, foi um acidente muito grave e todos se voltaram
para as famílias das vítimas. Nas diversas intervenções, nos momentos de
silêncio, no hospital. Foi um momento muito difícil que nunca pensei viver,
como conselheiro e pessoalmente, como familiar de uma vítima que tinha
falecido.
Na véspera da visita Cavaco Silva ao Principado, o presidente do
Parlamento de Andorra defendeu que a comunidade portuguesa residente há mais de
20 anos, deveria aceder à nacionalidade andorrana para consolidar o processo de
integração. Concorda?
Não. Primeiro, porque não faz sentido. Sou português e serei sempre português.
Não tenho nada a ganhar com a nacionalidade andorrana e não estou disposto a
renunciar à minha nacionalidade. Com o Tratado Bilateral, que entrou em vigor em Setembro
de 2008, foram atribuídos aos portugueses, os mesmos direitos que tinham
espanhóis e franceses. Antes disso, tínhamos que residir pelo menos há 20 anos
no país para podermos ter um negócio em nosso nome. Caso
contrário, precisávamos de um «empresta nome», um andorrano tinha que ser um
«testa e ferro». A empresa era nossa mas estava em nome de um andorrano. Agora,
com o Tratado, só precisamos estar há dez anos no país para abrir uma empresa.
Com 25 anos de Andorra, já tenho o negócio em meu nome e não faz sentido
renunciar à minha nacionalidade. Os meus filhos são portugueses até aos 18 anos
e depois têm que optar por uma das nacionalidades, andorrana ou portuguesa, já
que não existe o princípio de dupla nacionalidade em Andorra.
Mas gostaria sim de votar na Comunais, para as câmaras, para isso pago os meus
impostos. É algo que já reivindiquei não só para os portugueses, mas para
demais emigrantes que vivem aqui há mais e 10 anos. Devíamos poder decidir sobre
quem queremos que seja o nosso presidente da Câmara.
E que resposta recebeu?
Que não. De momento, isso não é possível. Eles têm muito medo de perder a sua
identidade. Nós emigrantes somos maioria, e se começam a deixar que todos
votem, ficam com a sensação de que vão perder a identidade deles. Mas eu penso
que devíamos ter o direito de decidir quem será o nosso presidente da Câmara.
Já para as eleições Legislativas, penso que são os andorranos que devem decidir
quem é o Chefe de Governo.
Ana Grácio Pinto
apinto@mundoportugues.org
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