A comunidade portuguesa em Andorra passou dos 9.980
residentes em 2004 para 13.362 em 2009, segundo números do Observatório da
Emigração, baseados em
dados do Departamento de Estatística do governo andorrano.
Mas em 2009, as estatísticas registaram menos 432 portugueses a viver no país,
do que no ano anterior.
Quem lá está, culpa a crise económica a que Andorra também não ficou imune, mas
os portugueses ainda representam 16 por cento da população e têm importância no
tecido económico do país. Existem em Andorra 340 empresas portuguesas que
empregam mais de duas mil pessoas, em diversas áreas, nomeadamente a construção
civil, a hotelaria e a restauração.
Num país onde a maior dos habitantes são estrangeiros - em 2009, do total de
84.082 habitantes do Principado, 51.997 eram estrangeiros - entende-se porque o
presidente do Parlamento tenha defendido que a comunidade portuguesa residente
há mais de 20 anos, deveria aceder à nacionalidade andorrana para consolidar o
processo de integração.
Em declarações à agência Lusa em Março - na véspera da visita a Andorra do
Presidente da República português - Josep Dallères disse preferir "que essa
comunidade, sem deixar as raízes portuguesas, se integre realmente aqui e forme
parte do país e sejam andorranos e possam votar, não apenas nas municipais, mas
em todas as eleições".
Um «convite» que não deverá ser aceite pela maioria dos portugueses que ali
vivem há pelo menos 20 anos (tempo mínimo de residência necessário para
acederem à nacionalidade andorrana). Isto porque Andorra não permite a dupla
nacionalidade e quem optar por se tornar cidadão de Andorra terá que renunciar
à nacionalidade portuguesa.
"Era o que faltava". Carlos
Ferreira não pensou duas vezes para responder perante a
hipótese de um dia vir a adquirir a nacionalidade andorrana. Apesar de nos
últimos quatro anos, ser em Andorra que reside e trabalha e de Portugal ser o
país onde regressa só para fazer férias e reencontrar a família.
Em Andorra, ganha o sustento. Em Portugal, estava desempregado, como revelou a
O Emigrante/Mundo Português. Mesmo assim, este minhoto, natural de Fafe, diz
que já não compensa ir sozinho para o Principado. "O nível de vida é caro. Em
Encamp (uma das principais cidades do Principado) paga-se 750 euros de renda
por mês por um apartamento com dois quartos, por um estúdio, paga-se 600
euros", afirma.
O elevado custo de vida não seria uma questão tão preponderante se a crise
económica não se fizesse sentir num país onde até há pouco tempo a palavra
«desemprego» praticamente não se ouvia falar. "Tenho amigos que trabalhavam na
construção civil e estão desempregados. Outros, estão a varrer as ruas", afirma
Carlos Ferreira. Diz que esse sector é um bom exemplo de que a crise económica
já chegou ao Principado.
"Na construção civil, paga-se pouco menos de dois mil euros, quando há quatro
anos pagava-se entre 3.500 e 4.000 euros. Em Andorra a vida está difícil",
sublinha, acrescentando que para poder juntar algum dinheiro, tem dois
empregos: é motorista durante o dia e trabalha num restaurante à noite. "Há
muitos portugueses que em Agosto vão embora e já não regressam mais a Andorra",
revela.
Por isso, já decidiu. Fica mais dois anos no país e depois vai-se embora, mas
não para Portugal - o destino deverá ser os Estados Unidos, onde tem
familiares.
"Cheguei a ganhar 4.000 euros"
António Pinto também não quer
passar o resto da vida em Andorra, país onde vive há já duas décadas e onde
chegou com 26 anos. "Não fico aqui para sempre, nem morto", afirma peremptório.
A intenção foi "ficar poucos anos", mas acabou por levar a mulher e uma filha,
na altura com 8 meses. A segunda já nasceu em Andorra, país onde sempre
trabalhou no sector da construção civil.
Agora, diz que "não há trabalho" e que "os salários reduziram". "Cheguei a
ganhar quatro mil euros por mês. Agora, ganho menos da metade. Antes,
trabalhava 12 horas, agora, só oito, e enquanto houver trabalho para essas
oito, está muito bom", refere.
António Cerqueira está ainda há mais tempo no Principado. Tem 55 anos, 25 dos
quais vividos em Andorra e é já um nome bastante conhecido na comunidade. O
dono do Bar Nau, verdadeiro ponto de encontro de muitos conterrâneos, e
presidente do Futebol Clube Lusitanos, uma das principais equipas da Liga de
Andorra, com aspirações a participar na Taça UEFA.
Natural de Ponte da Barca, António diz que quer regressar a Portugal, mas não
sabe ainda quando. Os três filhos fazem-no acreditar que estará sempre "lá e
cá". Foi sozinho para Andorra, vindo da Venezuela onde esteve cinco anos. Diz
que chegou "em meio a uma crise" económica, algo que não é uma novidade para
este minhoto.
"Esta é a terceira crise que presencio aqui, mas é aquele que sinto ser a pior,
porque agora tenho compromissos financeiros que não tinha antes", explica.
Apesar de viver no país há tempo suficiente para adquirir a nacionalidade
andorrana, essa é uma opção que não está nos seus planos. Diz que se sente à
vontade no país e que os andorranos "tratam bem os portugueses", mas acredita
que estes "não beneficiam nada com a nacionalidade andorrana".
José Manuel da Silva reside há 25 anos no país, mas diz que não pretende
adquirir a nacionalidade andorrana.
"Sou português, serei sempre. Não estou disposto a perder
a minha nacionalidade", afirmou a O Emigrante/Mundo Português.
Natural de Carrazeda de Ansiães, o Conselheiro das Comunidades Portuguesas e
empresário da restauração, é categórico a afirmar que o principal problema dos
portugueses em Andorra é "a falta de trabalho".
"Há pessoas que não conseguem pagar a renda e a escola dos filhos no fim do
mês", diz, acrescentando que vir para Andorra "não é a melhor opção". "Estou cá
há 25 anos mas é a primeira vez que ouço falar em desemprego", adianta,
acrescentando que "a construção está parada e a hotelaria em crise".
Donzília Laranjo está ainda há mais tempo em Andorra. Já
passaram 33 anos desde que deixou Almada e chegou ao país, juntamente com o
marido. Levava um contrato válido por seis meses para trabalhar num hotel,
renovou-o por mais um ano e a partir daí, "foi avançando".
Apesar do início difícil - "como o meu marido não tinha emprego, chegamos a
dormir no carro", recorda - diz que teve a sorte de encontrar andorranos que
lhe "deram a mão", como o patrão, Manuel Pons Pifarré, ex-ministro do Urbanismo
e Ordenamento Territorial de Andorra.
No país onde nasceu a única filha, Sabrina - de quem diz com orgulho ter-se
licenciado em Direito - abriram-lhe "os braços quando chegou e não tinha nada".
Por isso, apesar de vir a Portugal sempre que pode, não pensa deixar Andorra.
Com ou sem crise...
Ana Grácio Pinto
apinto@mundoportugues.org
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