Eles vêm principalmente do norte de Portugal para trabalhar e ganhar dinheiro e sonham em retornar à pátria. Nem sempre isso é bom para a sua integração no país alpino.
Vinte e três por cento ou 30,9 mil dos 190 mil habitantes dos Grisões, maior estado suíço em extensão, são estrangeiros. Os maiores grupos são os alemães (7524), portugueses (7141) e italianos (5600).
Para se ter uma ideia da forte presença de portugueses no cantão com a menor
densidade demográfica da Suíça basta ir à região da Engadina, um dos mais altos
vales povoados da Europa, com mais de 80 quilômetros de comprimento.
Em Sankt Moritz, conhecida como "berço do turismo alpino", bem como
nas vizinhas Pontresina e Samedan, dificilmente se encontrará um hotel ou
restaurante que não tenha funcionários do país de Camões. Também a construção
civil emprega muitos portugueses.
Um deles é Carlos Pinheiro, que emigrou em 1990 da região do Porto, trabalhou
sete anos na hotelaria e agora é operador de máquinas em Saint Moritz. Ele
diz que gosta do que faz e de como os suíços gerenciam suas empresas.
"Pagam sempre em
dia."
Pinheiro, que ainda tem uma "casinha" em Portugal,
não esconde o que muitos portugueses sentem na Suíça: saudades da pátria.
"Gostaria mais de estar no meu Portugal, se lá me dessem as possibilidades
que me dão aqui."
"Quase um gueto"
Mais de 200 mil portugueses vivem na Suíça. Segundo o presidente do Clube
Português da Engadina, Daniel Rufino, os primeiros deles chegaram à região há
35, 40 anos, através dos escritórios de apoio ao migrante.
"Depois, um foi trazendo o outro. Uma das razões é que no interior de
Portugal, principalmente no Norte, faltam oportunidades de emprego", diz
Rufino, chefe dos camareiros no Hotel Restaurante Häuser, em Sankt Moritz.
A gerente do Hotel Sonne St. Moritz, Maja Bonetti, explica que, "como os
primeiros imigrantes da região foram italianos e os portugueses aprendem com
relativa facilidade o italiano, eles acharam que teriam possibilidade de achar
emprego aqui". No trabalho e até no lazer, é comum ouvir portugueses
falando italiano com outros imigrantes ou suíços.
Segundo Bonetti, eles começaram a chegar aos poucos. "Depois trouxeram as
famílias e os parentes e já estão na terceira geração na Engadina. Agora, como
a comunidade é tão grande, tem lojas, clubes e outras coisas, se formou quase um
gueto. Se você quiser fazer compras é mais provável que possa falar português
do que outra língua."
O português é o terceiro idioma mais falado em Saint Moritz (7%) e Pontresina
(9%), depois do alemão e do italiano e à frente do quarto idioma nacional suíço,
o reto romano.
A suíça Maja Bonetti fala português brasileiro (ouça o podecast na coluna à
direita) com a maioria de seus funcionários - quase 80% deles vêm de
Portugal. "Muitos já trabalham há mais de dez anos na nossa empresa. Estou
muito satisfeita com eles; são confiáveis, limpos e trabalham muito", diz.
"A língua é um obstáculo"
Segundo Daniel Rufino, quando se fala de integração dos portugueses, "nós
temos uma maneira diferente de ser, o que, de certa forma, nos ajuda a nos
integrar nos ambientes em que nos inserimos, mas há uma barreira que nos é
imposta e que é difícil de ultrapassar", afirma.
"A língua é um obstáculo. E as pessoas aqui são um bocado frias, o que não
é regra geral", acrescenta Rufino. A língua é o grande problema especialmente
quando os filhos dos imigrantes frequentam a escola e os pais não conseguem
ajudá-los nas tarefas de casa, diz Bonetti.
Na opinião de Rufino, a superação deste obstáculo depende em primeiro lugar dos
imigrantes. "Somos nós que estamos num país que não é nosso. Somos nós que
temos de procurar vias para podermos nos integrar. Essa é uma responsabilidade
também dos clubes e das associações."
Na região da Engadina, além de várias lojas de produtos típicos, existem três
organizações portuguesas: o Futebol Clube Lusitanos de Samedan, a Associação de
Pais e o Clube Português da Engadina. Elas não se restringem a atividades
destinadas exclusivamente aos portugueses.
"As crianças são um elo de ligação"
"Penso que o desporto é uma via muito forte para a integração",
diz Rufino, referindo-se ao FC Lusitanos. Ele considera igualmente importante a
Associação de Pais porque "as crianças são um elo de ligação" entre
imigrantes e suíços. E o Clube Português, por exemplo, tem um coral que canta
também em celebrações em alemão e italiano.
Com 450 sócios e mais de uma dezena de equipes de futebol nas diferentes faixa
etárias, o FC Lusitanos é o maior clube português da Engadina. O time principal
disputou a terceira liga suíça no ano passado e agora está na quarta divisão.
Segundo Delfim Faustino do Carmo, presidente do clube desde 1990, pelo menos no
futebol, os portugueses podem medir forças de igual para igual com os suíços.
Segundo ele, um exemplo de como o futebol pode integrar é a equipe feminina do
FC Lusitanos, cuja base é formada por meninas suíças.
Mais do que o esporte, porém, o domínio do idioma é a chave para a integração,
diz Max Almeida, que veio em 1984 de Torouca (região do Douro) e há 15 anos
trabalha numa loja de artigos esportivos em Pontresina.
"É muito importante dominar várias línguas para poder trabalhar
aqui", afirma. Além do português, ele fala perfeitamente o alemão e se
comunica também em italiano, francês, inglês e espanhol. "Como família,
estamos bem integrados aqui", diz.
Mesmo assim, Max pensa em voltar para Portugal quando estiver aposentado e
os filhos tiveram condições de decidir por si mesmos o próprio destino.
"Penso que esta é a vontade de muitos portugueses."
Cursos de alemão para estrangeiros
Segundo Almeida, "há um enorme esforço político do governo suíço para
ajudar as nossas crianças na escola". Isso é visível em Saint Moritz, onde
30% dos alunos da Escola Municipal Grevas são filhos de estrangeiros - 17%
portugueses, diparado o maior grupo de imigrantes.
Segundo o diretor Reto Matossi, desde o jardim de infância, a escola oferece
aulas extras de "alemão como língua estrangeira" aos filhos de
imigrantes. No momento, está sendo preparado também um curso de alemão para
pais portugueses. Algumas empresas, como o Hotel Sonne, fazem o mesmo.
Matossi explica que as crianças não recebem apoio suficiente nas tarefas de
casa porque, em muitos casos, ambos os pais imigrantes precisam trabalhar para
garantir o sustento da família. "Mas o tempo que os pais passam com as
crianças, mesmo que seja lendo textos em alemão que eles não entendam, é
decisivo para a integração."
O diretor diz que não há diferença de desempenho escolar entre as crianças
suíças e os filhos de imigrantes quando estes dominam o alemão. "Os secondos já tem mais facilidade com a língua. E a terceira geração já vai falar
perfeitamente o alemão", prevê.
"Integrar o máximo possível"
A realidade na Engadina reflete um dilema dos portugueses que já se encontram
há décadas na Suíça: encontrar um equilíbrio entre a carga de trabalho, a
dedicação aos filhos, a preservação de suas tradições e o esforço de integração
à sociedade suíça, como explica Daniel Rufino.
"Mesmo estando a trabalhar 20 ou 30 anos na Suíça, temos de sentir o
espírito português dentro de nós. Mas é importante que vejamos também que é uma
mais valia podermos viver aqui. É o país que nos acolheu, nos dá a
possibilidade de trabalhar e ganhar mais dinheiro, que é a razão pela qual aqui
estamos", diz.
E Max Almeida faz um apelo aos seus conterrâneos. "Que se empenhem para se
integrar o máximo possível. Os suíços precisam de nós para trabalhar e nós
precisamos deles para seguir a nossa vida aqui" (ouça os podecasts na
coluna à direita).
Geraldo Hoffmann, swissinfo.ch, Engadina, aqui (acedido em 25 de Março de 2010).