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Economia portuguesa a caminho de mais uma década perdida
2010-03-10
Gerações jovens confrontadas com o risco de 20 anos sem oportunidades

por Bruno Faria Lopes, Publicado em 10 de Março de 2010  |  Actualizado há 10 minutos

Depois de na década passada ter crescido em média abaixo de 1% ao ano, a economia portuguesa arrisca mais dez anos de estagnação, sugerem as previsões do governo publicadas esta semana na versão sumária do Programa de Estabilidade e Crescimento (PEC). Nos próximos quatro anos Portugal vai crescer a uma média 1,2%, para chegar a 2014 com uma dívida pública próxima de 90% do PIB e um peso ainda grande da despesa do Estado - a margem da política orçamental para ajudar a subida dos salários e do emprego será quase nula nos anos seguintes.

"A primeira metade da década será uma época de grandes dificuldades económicas e altamente insatisfatória", confirma o economista José da Silva Lopes. "A política orçamental rigorosa vai ter consequências contraccionistas, mas não temos outra hipótese", acrescenta o ex-governador do Banco de Portugal. O que vai acontecer nos anos seguintes dependerá da capacidade de reformar a economia. "Se não alterarmos significativamente o modo de funcionamento da economia portuguesa, esta vai ser mais uma década perdida", junta o economista António Nogueira Leite.

Contudo, mesmo com a realização de reformas estruturais - cujo impacto demora a materializar-se - será difícil abrandar a política orçamental de contracção.

"Para abrir novas oportunidades para todos, sobretudo as gerações mais novas, seria fundamental descer os impostos e isso só é possível reduzindo a despesa", aponta Stephan Morais, 36 anos, o único português que integra em 2010 a lista de "Young Global Leaders" do Fórum Económico Mundial. Mas o PEC impõe sacrifícios nos próximos anos para deixar para 2014 uma fatia significativa de encargos: os custos com parceiras público-privadas em saúde e novas estradas disparam 80% nesse ano (para 1,6 mil milhões de euros) e entram os gastos da linha de TGV Lisboa-Porto (4,9 mil milhões). Nessa altura o peso da despesa pública estará acima de 45% do PIB.

Fora do PEC está também uma estratégia para pôr Portugal a crescer no médio-longo prazo - o documento é essencialmente contabilístico. "Falta o C no PEC: é um programa de estabilidade orçamental, que tem uma preocupação com a equidade [devido ao corte nos beenfícios fiscais], mas não com o crescimento", defende o sociólogo Pedro Adão e Silva, que lembra a camisa de forças orçamental imposta por Bruxelas.

Vaga de emigração

Para as gerações mais novas o cenário aberto pelo PEC confirma, na versão mais optimista, 14 anos de estagnação económica, com uma média de 1% de crescimento entre 2000 e 2013. "Uma situação única desde a Segunda Guerra Mundial", sublinha Nogueira Leite.

As pessoas com idades entre 25 e 44 anos representam metade da população activa de cinco milhões e o impacto da paralização da economia significa uma diminuição brutal das oportunidades. "As posições de liderança estão ocupadas pela geração mais velha, que tem mais 20 anos de vida activa pela frente", explica Stephen Morais. Cerca de 35% da população activa tem entre 45 e 65 anos. "A geração no meio, por muito qualificada que seja, tem poucos benefícios para ficar em Portugal: vejo isso pelos meus amigos. As lideranças políticas não se apercebem disto", acrescenta o empresário, que está a "montar um projecto fora de Portugal".

A emigração de jovens qualificados é uma realidade, mas a falta de atenção das políticas públicas reflecte-se na ausência de números. "Não há estatísticas em Portugal sobre o grau de qualificação na emigração - o tema não tem estado na agenda", confirma João Peixoto, professor no departamento de ciências sociais do ISEG, em Lisboa. O INE parou de contabilizar o fenómeno em 2003.

O impacto da economia débil é ainda mais grave para as pessoas com menos de 25 anos, para as quais o desemprego já superou 20%. "A transição da geração seguinte é mais preocupante: o mercado de trabalho está congelado e é muito segmentado", diz Adão e Silva. Ou seja, há pouca mobilidade entre trabalhadores precários e com contrato permanente, um problema que afecta mais os jovens dos países do sul da Europa.

"Em Dublin vejo muitos portugueses, espanhóis e italianos que emigraram", conta Catarina Kendall Alçada, 25 anos. Catarina foi para a Irlanda há um ano e meio, antes do pico da crise, e conseguiu um contrato de dois anos como tradutora. "Aqui consigo levar uma vida decente, sem pensar em dinheiro no final do mês. Saíria da Irlanda, mas não para voltar a Portugal".

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